24 de jul. de 2010

DEPOIS DA PRESSÃO, EMPRESAS DE CARTÃO VÃO REDUZIR TARIFAS

jornal A Gazeta (ES) 19/06/2010 - Mikaella Campos

A padronização de tarifas dos cartões de crédito vai reduzir para 20 a quantidade de serviços cobrados do consumidor. Hoje, o setor conta com mais de 60 taxas. A mudança faz parte da regulamentação da indústria de cartões. A intenção é impedir abusos, principalmente, a bitarifação.

Na verdade, tem sido muito comum o consumidor pagar duas vezes pelo mesmo serviço. Nomes diferentes são dados para uma mesma tarifa e muitos clientes não percebem a cobrança indevida. Sob pressão do governo e dos órgãos de defesa do consumidor, as operadoras de cartão já aceitaram fazer melhorias.

Segundo um levantamento do Ministério da Justiça, a maioria das taxas no mercado não são descritas de forma clara e objetiva para o consumidor. Um exemplo disso é a cash by phone, uma taxa cobrada todas as vezes que o cliente solicita crédito pelo telefone.

A Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito (Abecs) já afirmou que vai aproveitar o modelo de padronização adotado pelos bancos para também unificar as tarifas dos cartões.

Há dois anos, as instituições bancárias cobravam por mais de 80 serviços . Hoje, 31 taxas são regulamentadas pelo Banco Central para o setor. A operação para regulamentar também a indústria de cartões será feita pelos ministérios da Justiça, da Fazenda e Banco Central.

Para a coordenadora da Associação Brasileira de Consumidores (Proteste), Maria Inês Dolci, o consumidor paga taxas sem perceber. "Muitas vezes, a tarifa vem embutida nas compras e o consumidor acaba nem vendo que está pagando por algo que não contratou", afirma.

Serviços como seguro de vida e manutenção de taxa de inatividade são os maiores absurdos cobrados. "Além da padronização, acredito que algumas tarifas deveriam ser banidas, já que as operadoras tentam passar para o consumidor custos relacionados ao risco do negócio, como é caso de emissão de cartão e segunda via de senha", afirma.

O economista Laudeir Frauches afirma que o maior problema dos cartões de crédito está relacionado à falta de atenção do consumidor. "Às vezes a pessoa fica mais preocupada com a anuidade e com a taxa de juros e acaba esquecendo de ver quanto que vai pagar por alguns serviços", acrescenta.

Como não há uma fiscalização e nem ações de proteção ao consumidor, ele afirma que é preocupante a quantidade de cartões que são colocados no mercado anualmente. "A previsão é que, até o fim de 2010, sejam emitidos mais de 630 milhões de unidades", afirma.

Com a padronização das tarifas, Laudeir acredita que será mais fácil para o consumidor fazer comparações e ver em qual banco vai contratar o serviço.

"No caso das tarifas bancárias, a pessoa nem precisa fazer muita pesquisa. No site do Banco Central é possível realizar as comparações e escolher o banco com o preço mais atraente", acrescenta.

Ninguém fica sem o "dinheiro de plástico"

O cartão de crédito tem sido um grande aliado do consumidor. Afinal, ele facilita o pagamento e gera segurança para quem não gosta de andar com dinheiro. Para a pessoa que só conta com uma opção de cartão, a ferramenta é até uma forma da pessoa controlar as finanças. No entanto, enquanto a regulamentação do setor não sai, os consumidores começam a ficar de olho nos abusos cometidos pelos bancos. A estagiária Eiluane Jacbsen está atenta às cobranças indevidas e principalmente à taxa de juros. "Colocar regras para os cartões será uma maneira de o consumidor se sentir mais seguro. Hoje, a gente não sabe pelo que realmente paga quando faz um cartão", afirma. A jovem atualmente tem um cartão de crédito e conta com dois cartões de loja. "Gosto de controlar o uso até para não ficar endividada", afirma a estagiária. A coordenadora da Proteste, Maria Inês Dolci, orienta ao consumidor a tomar cuidados também com os cartões de loja. "São cartões de crédito com taxas de juros que chegam a mais de 512% ao ano. Para piorar a situação, o produto também tem várias tarifas. Algumas são incluídas na fatura, como seguro contra perda e roubo. Nestes casos, o consumidor acaba contratando o serviço sem perceber", alerta.

Preço das taxas varia até 600% entre operadoras

O consumidor, além de pagar tarifas com nomes que não deixam claro o objetivo, ainda é prejudicado pelos altos custos das taxas. A diferença de preço de um banco para outro chega a 600%.

Esse abuso foi percebido num levantamento do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). O estudo, realizado em seis dos maiores bancos do país, mostra que, em alguns casos, as taxas dos cartões são maiores do que as tarifas bancárias.

Segundo o Idec, os preços das taxas de inatividade - cobrança que já é considerada abusiva - variam de R$ 10 a R$ 70 por trimestre, dependendo do tipo de cartão de crédito. A diferença de preços, neste caso, é de 600%.

A pesquisa do Idec aponta ainda a existência de tarifas, no mínimo, pouco usuais. Entre elas, a de segunda via para senha. Alguns bancos pedem R$ 3 pelo serviço. O órgão considera a taxa abusiva, por caracterizar dupla cobrança, já que o cliente paga a manutenção.

Outras tarifas cobradas pelos cartões são a de saque nacional e internacional. Segundo o Idec, os bancos chegam a cobrar R$ 8 pelo serviço em território nacional. Pelo saque internacional, os preços mais salgados são de 3% do valor da transação. O custo chega a R$ 20. Segundo o Idec, essas mesmas taxas cobradas nas operações de conta-corrente custam em média, R$ 2,40.

Outra taxa polêmica é a de excesso de limite, acionada quando o cliente ultrapassa o seu limite de crédito no cartão. Os bancos cobram até R$ 15, apesar dos juros elevados.

Diferença de preços

Além dos abusos relacionados às tarifas, os órgãos de defesa do consumidor estão preocupados com possibilidade de o comércio cobrar preços diferenciados para quem pagar no cartão.

A ideia encontra resistências também das empresas de cartão, que estão preocupadas em perder lojistas, que atualmente aceitam cartões. Para as operadoras, a diferenciação de preço vai aumentar a informalidade.

Os órgãos de defesa do consumidor enxergam que a aplicação dos preços diferenciados é uma forma de punir o consumidor que usa o cartão. Eles explicam que o cidadão já paga pelo serviço ao bancar uma taxa de manutenção e que os custos da utilização do cartão deveriam ser negociados entre lojas e operadoras.

Em débito, 15 milhões endividados

Mais de 15 milhões de pessoas no Brasil estão em débito no cartão de crédito, segundo o economista Laudeir Frauches. A maior parte dos devedores é de baixa renda e tem uma dívida de R$ 5 mil. A previsão é de que a indústria de cartões tenha lucro superior aos R$ 355 bilhões até o fim do ano.

Saiba o que é caro e abusivo

- Taxas de inatividade: variam de R$ 10 a R$ 70 por trimestre, dependendo do tipo de cartão de crédito.
- Segunda via de senha: custa, em média, R$ 3 nas principais operadoras de cartão de crédito.
- Saque com cartão (nacional): R$ 8 por serviço feito no Brasil.
- Saque internacional: a taxa chega a R$ 20 em algumas instituições bancárias. Outras cobram, em média, R$ 15.
- Taxa de ultrapassagem do limite de crédito: os bancos cobram, em média, R$ 15 quando o cliente precisa aumentar o limite do cartão para fazer uma compra.

Máquina única para lojista causa impasse

A partir de 1º de julho, o lojista poderá ter apenas uma máquina para aceitar todas as bandeiras de cartões de crédito. O problema é que, com o fim da exclusividade entre operadoras e credenciadoras, as empresas do setor estão tentando fechar contratos de fidelização com os comerciantes.

Nas propostas, o lojista encontra vantagens, como taxas reduzidas e aluguel mais baixo para o equipamento. Em contrapartida, o empresário é obrigado a ficar ligado à operadora pelo menos um ano.

Se romper o contrato, o lojista precisará pagar multa, assim como ocorre hoje com os consumidores da telefonia celular.

Com essa imposição, o setor varejista teme que a concorrência entre as companhias seja adiada para daqui a um ou dois anos.

O problema foi apresentado ao Ministério da Justiça. O órgão promete fiscalizar e repreender essas atitudes de assédio ao empresário.

Hoje, as máquinas da Cielo só passam os cartões da Visa, enquanto a Redecard, da Mastercard. Isso implica em custo dobrado para os lojistas não só com o uso de linhas, mas também com o aluguel dos aparelhos. A locação custa, em média, R$ 120.

Com a unificação dos aparelhos, lojistas que aceitam diversas bandeiras terão uma redução significativa nos custos do negócio. A expectativa do Ministério da Justiça é de que a economia dos comerciantes sejam repassadas para o consumidor final.

Banco Central deve fiscalizar empresas

O Banco Central (BC), assim como faz com os bancos, também poderá ser o órgão responsável em fiscalizar as operadoras de cartões de crédito. O setor, hoje, não tem nenhum tipo de regra. As empresas cobram as taxas do cliente, sem nenhuma norma e padronização. O Ministério da Justiça deve enviar ao Congresso um projeto de lei dando ao Conselho Monetário Nacional (CMN) a prerrogativa de criar normas para a indústria de cartões. Para tanto, o BC e os ministérios da Justiça e da Fazenda já prepararam um diagnóstico profundo do setor. Os órgãos acreditam que a indústria de cartões é muito concentrada, desfavorecendo a concorrência tanto para lojistas quanto para consumidores finais. A consequência disso é o aumento nos preços e também nos custos dos negócios.

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