21 de set. de 2010

REDE DE VAREJO LANÇA FUNDO DE CRÉDITO

jornal Valor Econômico 21/09/2010 - Carolina Mandl

Em um momento de franca expansão do varejo no Brasil, as redes varejistas estão buscando nos fundos de direitos creditórios (FIDCs) um caminho alternativo para diversificar sua fonte de captação de recursos para fazer investimentos. O Ponto Frio (Globex) vai lançar cotas de um fundo de R$1 bilhão, enquanto a Lojas Renner terá outra oferta de R$ 350 milhões. E, segundo o Valor apurou, o movimento não deve parar por aí. A Lojas Americanas também avalia essa opção.

Em ambos os casos, o que Lojas Renner e Ponto Frio estão vendendo aos investidores são os valores devidos pelos clientes que fizeram compras em suas lojas com cartão de crédito. Para conseguir antecipar esses recursos, as redes oferecem aos coristas uma taxa de desconto sobre a carteira de recebíveis.

As lojas acumulam bilhões de recebíveis em seus balanços e, por isso, tentam transformar isso em dinheiro. Segundo dados apresentados pelo grupo Pão de Açúcar, com 9,2 milhões de cartões ativos, só os clientes da Globex (agora somada à Casas Bahia) que possuem cartões da loja têm R$ 16 bilhões em limite de crédito. A Renner tem 16 milhões de cartões de marca própria. Isso sem contar as demais transações com outros cartões.

"Em um cenário em que as varejistas brasileiras estão revisando a previsão de aberturas de lojas para cima, acelerando os planos de crescimento, faz sentido buscarem novas fontes de financiamento", diz Renato Prado, analista da corretora Fator.

A vantagem para as lojas está no fato de, em muitas vezes, elas conseguirem pagar por esse dinheiro uma taxa menor do que outras fontes de captação ofereceriam. Se o Ponto Frio lançasse uma debênture, por exemplo, provavelmente seu custo seria maior. Isso porque, conforme a Moody's, a nota de classificação de risco do grupo Pão de Açúcar, ‘A+(bra)’, é mais baixa do que aquela atribuída ao FIDC Globex, que é ‘AAA(bra)’. Ou seja, os investidores pediriam uma remuneração mais alta para correr o risco da varejista.

A nota mais elevada se tornou possível porque o fundo da Globex vai comprar apenas os recebíveis devidos pelas credenciadoras de cartões de crédito — Amex, Cielo, Redecard e FIC (financeira do Pão de Açúcar com o Itaú Unibanco)—e o risco delas é considerado bastante baixo. Os investidores não vão depender da capacidade de pagamento dos consumidores da rede.

Tradicionalmente, as varejistas já cedem seus recebíveis para terceiros, inclusive para empresas que depois colocam esses papéis em fundos. Porém, essas colocações são pontuais. São dezenas de operações fechadas ao longo do ano, dependendo sempre do humor do tomador e das condições de mercado para fechar o valor de compra da carteira. Agora, com a estruturação de um FIDC, as redes conseguem travar uma taxa por um tempo determinado. No caso do fundo da Globex, pode vir a captar R$ 1 bilhão por 111% do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI) por três anos. Além disso, a própria Globex investe no fundo por meio das cotas subordinadas, que pode vir a somar até R$ 192,8 milhões e que são as primeiras a serem atingidas em caso de inadimplência, funcionando como uma espécie de colchão de proteção.

No caso da Renner, a remuneração dos investidores ainda não foi divulgada. Para os R$ 350 milhões que os investidores colocarem, ela comprará outros R$ 150 milhões de cotas subordinadas. Além disso, a empresa fica com a obrigação de adicionar novos recursos caso as cotas subordinadas sejam corroídas ao longo do tempo pela inadimplência. As cotas subordinadas devem representar 30% do patrimônio liquido do fundo.

Em 2007, o Pão de Açúcar testou esse tipo de operação com um FIDC de R$ 130 milhões. Porém, essa operação não foi vendida aos investidores, tendo ficado nas mãos de apenas de um banco. Agora é que a rede vai descobrir o apetite do mercado.

Para a Renner, esse fundo marcará sua estreia nas finanças estruturadas. O FIDC, porém, tem características bastante distintas daquelas oferecidas pelo fundo da Globex. O risco que os cotistas correrão não será o das credenciadoras, como Redecard e Cielo. Isso porque as operações cedidas ao fundo terão como origem as vendas realizadas com o cartão de marca própria, o cartão Renner.

Essas transações são financiadas pela própria Renner ou, quando elas envolvem a cobrança de juros, pelo Itaú Unibanco, segundo um contrato fechado entre a varejista e a instituição financeira. Ambos estão cedendo ao fundo o direito que têm de receber dos consumidores pelas vendas realizadas na Renner. Ou seja, o risco de inadimplência é o do cliente da rede de lojas, que, de acordo com informações contidas no prospecto da operação, são em sua maioria mulheres e solteiros.

Entretanto, ainda faltam maiores detalhes sobre a operação da Lojas Renner. A nota de classificação de risco do FIDC, por exemplo, ainda não foi divulgada, tampouco a sua remuneração.

Procurados pela reportagem Globex, Lojas Renner e Itaú BBI (coordenador das ofertas do fundos) não retornaram os pedidos de entrevista.

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