1 de jul. de 2011

CARTÕES DE VAREJO ESTÃO NA MIRA DE FISCALIZAÇÃO

jornal Brasil Econômico 30/06/2011 – Flávia Furlan

Deputados e entidades de defesa do consumidor estão cobrando do Banco Central que fiscalize também os cartões distribuídos pelo varejo e que não têm uma instituição financeira envolvida no negócio, mas apenas uma administradora de cartão. Esses plásticos representam 10% do mercado, mas têm crescido com um papel social e econômico, de acordo com especialistas. O problema é que, junto com esse crescimento, há um aumento das reclamações por parte dos consumidores, assim como ocorre no setor como um todo.

Para se ter uma ideia, o mercado de cartões de varejo, com ou sem suporte de uma instituição financeira, totalizou em 2010 cerca de 170 milhões de plásticos, um incremento médio de 16% ao ano desde 2006. Os cartões sem bandeira ou que só podem ser utilizados no estabelecimento comercial somam 124 milhões.

Dados do Ministério da Justiça mostram que entre os assuntos mais demandados nos Procons no ano passado, o primeiro foi cartão de crédito, seguido por telefonia celular e banco comercial. No caso dos setores mais reclamados, quando há demanda dos consumidores seguida por abertura de um processo administrativo, os cartões estão dentro do tema assuntos financeiros, que ocupa o segundo lugar no ranking, Os plásticos representam 33,16% das reclamações no tema. Os principais problemas relatados em cartões são abuso na instituição de tarifas, déficit de informação sobre crédito, alteração unilateral do contrato e envio de cartão de crédito sem solicitação.

De acordo com o ministério, os órgãos de defesa do consumidor estão bastante atentos ao fato de os cartões de varejo não estarem sob as mesmas regras do Banco Central e têm demonstrado influência. Uma pressão feita pelo órgão fez com que novas regras de tarifas passassem a valer para o mercado de cartões sob a fiscalização do BC desde 1º de junho deste ano.

Os deputados defendem que o BC fiscalize também administradoras de cartões, além das instituições financeiras. Em2004, foi editada uma súmula no Superior Tribunal de Justiça, de número 283, que tinha esse reconhecimento. A súmula é a interpretação pacífica ou majoritária adotada por um tribunal a respeito de um tema. No entanto, ela não está sendo aplicada, conforme defendido pelo grupo envolvido na Proposta de Fiscalização e Controle do setor de cartão de crédito (PFC 10/2003) da Câmara.

O deputado Walter Ihoshi (DEM-SP), que participa das discussões, diz que hoje no Brasil ninguém cuida desses cartões do varejo e, então, o consumidor fica abandonado. “O ideal seria o Banco Central também fiscalizar, já que eles fiscalizam as instituições financeiras e as operações são idênticas”, avalia o parlamentar.

Já o deputado Roberto Santiago (PV-SP) explica que a intenção não é fazer com que as administradoras se transformem em instituições financeiras, mas que suas atividades sejam acompanhadas de perto pelo BC. “É isso que vamos pedir: que o Ministério Público cobre do Banco Central que ele considere a súmula. Se tem a súmula que diz que as administradoras têm de ser tratadas como instituições financeiras, por que o BC não está fazendo isso?”

De acordo como deputado Santiago, a preocupação da casa é com as reclamações no mercado de cartões de crédito como um todo, mas com uma atenção especial aos plásticos emitidos sem fiscalização. Nestes cartões, segundo ele, as taxas de juros cobradas dos consumidores podem chegar a 568% ao ano. “Pegue as milhões de pessoas que mudaram de classe social e agora entram em uma loja e se deixam levar por cartões que oferecem esses juros. Como elas não têm costume, imagina o que pode acontecer com o orçamento deles”, pondera.


“Tiro de canhão para matar mosquito”

O presidente da consultoria em varejo financeiro Boanerges e Cia., Boanerges Ramos Freire, diz que é interessante a ideia de fiscalizar mais de perto o setor de cartões. No entanto, ele acredita que essa questão precisa ser mais bem discutida e que a supervisão por parte do Banco Central seria como um "tiro de canhão para matar mosquito", que poderia até resolver as práticas indevidas dos plásticos do varejo, mas por outro lado tiraria do mercado empresas que têm um papel econômico e social importante.

Apesar de representarem uma minoria no setor, esses cartões de varejo sem uma instituição financeira por trás muitas vezes são regionais e podem atender a uma população que não tem contato com o sistema financeiro, inclusive ensinando como utilizar o instrumento de pagamento. Seria como um primeiro passo à bancarização.

O consultor considera que o setor de cartões é bastante inovador, mas às vezes muito agressivo nas vendas, inadequado na cobrança e desatencioso na abordagem com o cliente, até mesmo pela quantidade de transações e de consumidores. Porém, ressalta que não se pode julgar o setor inteiro. "O cartão de crédito tem fama de ser bicho papão. Não é um anjo, mas não é só fonte de problemas e aspectos negativos", finaliza.

Sobre toda essa discussão, o Banco Central destaca que seu entendimento é de que cartão de crédito sem banco emitindo não é objeto nem de sua regulação nem de sua fiscalização. Ele reitera que só normatiza cartões emitidos com uma instituição financeira envolvida no negócio.

Nenhum comentário: