Uma empresa do porte da TAM, maior companhia aérea do país com faturamento de 12 bilhões de reais e 44,5% de participação de mercado, abrir o capital de uma de suas unidades — no caso, a do programa de fidelidade — parecia uma barbada. Criada em 2009, a Multiplus contava com 6 milhões de clientes e parcerias com mais de 120 empresas na época de seu IPO, em fevereiro de 2010. A operação, no entanto, deixou a desejar. Foram captados na bolsa 692 milhões de reais, 5,35% menos que o mínimo previsto pelos executivos da companhia e pelo BTG, banco que coordenava a operação. Na época, o desempenho foi explicado pela ressaca provocada pela crise nos mercados do mundo inteiro e, sobretudo, pelo fato de a Multiplus apresentar um modelo de negócios ainda inédito no Brasil e difícil de ser explicado a investidores e consumidores: os pontos adquiridos por meio de compras em determinados estabelecimentos ou com milhagens da TAM poderiam ser trocados tanto por passagens quanto por, digamos, créditos no celular Passado pouco mais de um ano desde o IPO, tudo indica que as dúvidas a respeito da empresa se dissiparam. Pelo menos, no que diz respeito aos investidores. Com pouco mais de 90 funcionários, a Multiplus faturou 1,1 bilhão de reais em 2010 e seus papéis valorizaram espantosos 107,8% desde a abertura de capital até a primeira quinzena de maio deste ano. No mesmo período, o Ibovespa subiu 2%. Hoje, seu valor de mercado beira os 5,2 bilhões de reais, próximo ao da companhia-mãe, a TAM, avaliada em 5,3 bilhões. "Os investidores finalmente entenderam como funciona nosso negócio", diz Eduardo Gouveia, presidente da Multiplus.
Não foi de uma hora para outra que analistas e investidores passaram a enxergar na Multiplus um modelo capaz de dar lucro. Muitos deles tinham fresco na memória o fracasso do programa de fidelidade Smart Club, extinto em 2004, que reunia, além da TAM, pareciros como a rede de postos de combustível Shell e a Lojas Americanas. A partir da metade do ano passado, no entanto, a Multiplus fechou uma série de parcerias que deram mais fôlego ao negócio: 28 delas para o acúmulo de pontos, chegando a um total de 151 associados, e outras seis para a chamada "coalizão", que permite a troca de pontos por produtos ou serviços — entre eles estão a empresa de TV por assinatura Sky, a rede de hotéis Accor e o grupo Multi, dono da escola de idiomas Wizard. Cada uma dessas empresas parceiras paga uma espécie de taxa de administração para participar do programa. Além de companhias associadas, a estratégia da Multiplus atraiu 600 000 novos clientes em pouco mais de seis meses, fazendo com que sua carteira chegasse a 8 milhões de associados no final de 2010.
No início deste ano, o ritmo de expansão continuou intenso. Entre janeiro e março, a companhia fechou outras 20 parcerias, cinco delas de coalizão — as maiores foram com o site do Ponto Frio, a rede de farmácias Droga Raia e até a BM&F Bovespa. As alianças atraíram mais 300 000 "sócios". "Ao fazer parcerias com empresas de diversos ramos, a Multiplus dilui o risco de basear seu negócio apenas na troca de passagens aéreas", afirma Luciano Campos, analista do HSBC. "É um sistema bem diferente dos programas de fidelidade tradicionais."

Até agora a expansão da Multiplus foi beneficiada pela quase ausência de concorrência — situação que deve mudar radicalmente a partir do segundo semestre. A Dotz, que há 11 anos funciona como um programa de fidelidade na internet e já possui 2 milhões de clientes cadastrados, fechou no final de 2009 uma parceria com o Banco do Brasil e a Cielo para estender seus serviços ao mundo "offline". A partir de julho, os participantes do programa na Região Centro-Oeste do país poderão trocar seus pontos "virtuais" por produtos e serviços em cerca de 50 estabelecimentos, entre eles a rede de postos Ale e a cadeia de fast food Bob's.
Até o final deste ano, outras quatro capitais, além de cidades do interior de São Paulo, devem contar com o serviço. Desde outubro de 2009, a Dotz vem testando o programa em Belo Horizonte. "Em pouco mais de um ano, a Dotz nos acrescentou 25 000 novos clientes na cidade", diz Marcello Farrel, diretor da marca Bob's. O programa Vantagens, do grupo de promoções WebPartners, também vai entrar na disputa. Em maio, a empresa fez um acordo com a Cielo para contabilizar pontos em 1 000 estabelecimentos em Brasília e Goiânia. Diante da ameaça da concorrência, a Multiplus tem buscado novas parcerias. A mais recente foi com a Redecard. O contrato, fechado em setembro, permitirá o acúmulo de pontos em restaurantes na capital paulista. Manter o crescimento é a única forma de a Multiplus continuar a reluzir na bolsa.
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