30 de jun. de 2011

GALEAZZI COSTUROU ENTRADA DO BTG NO NEGÓCIO

jornal Valor Econômico 29/06/2011 - Daniele Madureira

No início da tarde de ontem, o engenheiro Pércio de Souza, sócio da butique de investimentos Estáter, explicava aos jornalistas a intrincada operação de associação entre Pão de Açúcar e Carrefour, estruturada por ele. Depois de uma rápida saída da sala para um café, Souza voltou confiante: "As ações do Pão de Açúcar estão subindo 11%", disse o engenheiro. "Sinal que o mercado está recebendo bem a notícia."

Ao mencionar o "mercado", Souza se referia aos investidores. O papel fechou o dia com alta de 12,64%. Mas a operação que torna o Pão de Açúcar sócio do Carrefour mundial, com a manutenção de Abilio Diniz à frente do negócio, provavelmente na presidência do conselho de administração do Novo Pão de Açúcar (NPA), segundo apurou o Valor , não interessa aos demais players do setor varejista - rivais e fornecedores.

A nova companhia concentrará quase um terço do varejo no Brasil. Em um setor que movimentou R$ 201,6 bilhões em 2010, o Pão de Açúcar respondeu por 17,9% das vendas (considerando Casas Bahia e Ponto Frio), enquanto a fatia do Carrefour ficou em 14,4%. O terceiro colocado no ranking, o Walmart, tem 11%.

Na justificativa da possível concentração, o sócio do BTG Claudio Galeazzi - um dos responsáveis pela área de "merchant banking" do banco, onde estão as operações de varejo - disse que, nos Estados Unidos, o Walmart é dono de 32% das vendas. Na França, o Carrefour teria 26%. Daí ser natural, diz, que o Brasil tenha uma operação forte nacional, com participação inclusive no exterior. "A concentração é muito menor do que pensávamos no começo", afirmou.

Em relação a sinergias entre as duas empresas, que ficarão reunidas no NPA, Galeazzi estima € 560 milhões, ou algo em torno de R$ 1,3 bilhão a R$ 1,8 bilhão. "Também teremos a chance de implantar as melhores práticas de gestão nas bandeiras do Carrefour Brasil, a fim de aumentar a eficiência da empresa." No ano passado, a filial brasileira da rede francesa foi responsável por um rombo contábil de € 550 milhões nas contas da matriz, devido a créditos de fornecedores contabilizados de maneira indevida. Segundo Galeazzi, essa conta ficou com o Carrefour na França.

Segundo apurou o Valor, Galeazzi, famoso pelas reestruturações de empresas como Lojas Americanas e o próprio Pão de Açúcar, do qual participou do conselho de administração até ir para o BTG, na metade de 2010, foi o responsável pela entrada do banco no negócio. No início deste mês, Galeazzi teria mandado um e-mail para Abilio Diniz e para Pércio de Souza demonstrando o interesse do banco em participar da operação.

Foi prontamente atendido por Souza, que colocou o BTG na estrutura do negócio, com uma participação de 3,2%, o equivalente a € 300 milhões. Além disso, o banco se comprometeu a captar € 500 milhões para o NPA. Mas a missão não foi tão simples. Galeazzi teve que vencer a resistência do banqueiro André Esteves, controlador do BTG, para participar do negócio. "Há um certo conflito de vaidades", diz um interlocutor que acompanhou a operação, referindo-se a Esteves e Diniz.

Se a proposta da associação entre Carrefour e Pão de Açúcar for aprovada, Galeazzi, que completou 71 anos na segunda-feira, terá capitaneado o seu primeiro grande negócio à frente do BTG.

A operação ainda terá que enfrentar as possíveis restrições impostas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e uma forte pressão dos grandes fornecedores. Galeazzi afirmou que, no NPA, as compras ficarão a cargo do Brasil - mesmo considerando que o Carrefour costuma costurar acordos mundiais com fornecedores multinacionais, a exemplo da Nestlé. "O Brasil manteria certa independência", afirmou.

Em relação às lojas, Galeazzi afirmou que deve haver sobreposição especialmente no Rio e em São Paulo. "Nada impede que possamos transferir bandeiras, mudar formatos de loja ou, eventualmente, fechar algum ponto."

Enquanto BTG, Estáter e Diniz pensam no futuro de uma companhia única, o Casino, sócio de Diniz na Wilkes, atual controladora do Pão de Açúcar, já pediu a Diniz uma reunião de acionistas. Diniz tem sete dias para responder.

Na nova estrutura, além de ter sua participação diluída, o Casino perderia a oportunidade de assumir o controle do Pão de Açúcar, que já era, sozinho, líder nacional do varejo. O Brasil é a mais importante operação do Casino no mundo. Na França, sede da companhia, a empresa tem apenas 12% do mercado, contra 60% do Carrefour.

As conversas entre Diniz e o Carrefour vieram a público no fim de maio. Quando soube, Jean-Charles Henri Naouri, o presidente do Casino, pediu explicações a Diniz. O brasileiro teria confirmado a aproximação, mas não deu detalhes. Em 31 de maio, o Casino recorreu à Câmara Internacional de Comércio, em São Paulo, pedindo arbitragem contra Diniz para manter os acordos fechados entre as partes em novembro de 2006 na Wilkes.

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