jornal Valor Econômico 31/08/2011 - Murillo Camarotto
Com a economia crescendo acima da média nacional na última década, tornou-se comum ver economistas e empresários elevarem o Nordeste ao posto de "China Brasileira". Exageros à parte, a região parece mesmo destinada a comparações com os emergentes asiáticos. Alvo preferencial do crescente mercado brasileiro de call centers, o Nordeste passou a ser chamado por profissionais do setor de "Nova Índia", referência ao país famoso pelo imenso número de centrais de atendimento.
Ontem a presidente da República, Dilma Rousseff, participou da inauguração da maior central de call center da América Latina, localizada no bairro de Santo Amaro, no centro de Recife. Terceira filial pernambucana da Contax, controlada pela Oi e líder nacional do setor, a central ocupa uma área de 42 mil metros quadrados, onde podem trabalhar ao mesmo tempo até 6 mil atendentes. Se considerados todos os turnos, pouco mais de 10 mil já trabalham no local, que custou R$ 100 milhões.
Com a queda nos preços das chamadas telefônicas nos últimos anos, em especial no atacado, tornou-se economicamente interessante abrir centrais de atendimento no Nordeste, onde os custos de mão de obra são inferiores aos de cidades como Rio e São Paulo.
"Vem crescendo a passos largos esse movimento de trazer as operações ao Nordeste. Temos dado prioridade para as principais capitais da região", disse ao Valor o presidente da Contax, Michel Sarkis. Dos cerca de 100 mil atendentes da empresa no Brasil, 38 mil estão no Nordeste, sendo 17 mil no Recife, 11 mil em Salvador e 10 mil em Fortaleza.
Sócio da Datamétrica, empresa pernambucana do setor, o economista Alexandre Rands calcula que o Nordeste tenha hoje pouco mais de 70 mil operadores de telemarketing, número que corresponde a menos de 10% do total de profissionais atuando no Brasil, algo em torno de 1,2 milhão de pessoas, segundo estimativa da Associação Brasileira de Telesserviços (ABT). "Não tenho dúvidas de que a tendência é de crescimento expressivo na região. No longo prazo, o Nordeste vai virar a Índia do Brasil", afirmou Rands.
A previsão, compartilhada pelo presidente da Contax, leva em conta o relevante potencial de expansão do setor de call center, que vem crescendo além dos 10% nos últimos anos. Na avaliação dos dois executivos, o desempenho deve se manter no mesmo ritmo pelo menos até 2015. "Trata-se de um mercado em franco crescimento, especialmente para clientes de serviços financeiros, de telefonia e TV por assinatura", disse Sarkis.
Segundo estimativas de mercado, que não dispõe de dados consolidados, o setor faturou algo próximo a R$ 10 bilhões no ano passado. Para 2011, está previsto um incremento de 10% a 20%. Atualmente, as principais empresas do setor, como Atento, CSU e Provider, além da própria Contax, têm atuação na região Nordeste.
Mais famosa porta de entrada para o mercado de trabalho, as cabines de teleatendimento atraem jovens nordestinos, para quem as oportunidades de ocupação formal ainda são escassas. "Para a nossa idade, é o só que tem", queixou-se a pernambucana Cintia Coutinho, 19 anos, que conseguiu o primeiro emprego com carteira assinada na central da Contax. Mas é algo temporário. Os baixos salários e as poucas oportunidades de ascensão dentro das empresas ainda são os responsáveis pelo alto índice de rotatividade de funcionários, que impacta diretamente sobre a qualidade do atendimento.
Ontem à noite, cerca de 200 funcionários da Contax protestavam em frente à nova unidade no Recife, por melhores salários. Em média, um atendente recebe um salário mínimo (R$ 545,00).
Para enfrentar esse cenário, a Contax tenta viabilizar o maior número de promoções possível. "A gente tem muita oportunidade interna. Um dos nossos valores é a meritocracia", garante o presidente da empresa. Ainda assim, a atendente Valkiria Vanessa da Silva, 24 anos, vislumbra um futuro longe da Índia Brasileira: "Quero abrir meu próprio negócio".
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