4 de set. de 2011

MAIS CRITÉRIO NA CONCESSÃO DE CRÉDITO

jornal Diário do Comércio 02/09/2011 - Rejane Tamoto

A redução de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros (Selic), além do anúncio de aumento da meta de superávit primário para este ano sinalizou que o Brasil está se preparando para a desaceleração da economia das potências globais e, nesse cenário, a palavra-chave para quem concede crédito ao consumidor é disciplina. O momento é de gerenciar o portfólio de risco de crédito de forma sustentável. O tema foi discutido na manhã de ontem na palestra seguida de debates "O Risco do Crescimento do Crédito ao Consumo", durante a programação do Congresso de Cartões e Crédito ao Consumidor (C4), em São Paulo.

Um dos participantes, o diretor de produtos da Boa Vista Serviços (BVS, da Associação Comercial de São Paulo que publica este Diário do Comércio), Leonardo Soares, disse que as perspectivas para o crédito são positivas neste ano, mas o cenário econômico global ainda vai exigir que o governo faça o dever de casa. "A ação de política monetária demora três meses para surtir efeito na economia. A redução da taxa e mais os cortes fiscais feitos geram um clima de realinhamento da trajetória dos juros. Será preciso ver como a crise vai impactar nossas exportações para a China."

Consciência – Segundo o superintendente-executivo de cobrança da Losango, Augusto Mello, o risco global chega ao Brasil e, mesmo que esses efeitos não sejam conhecidos, os empresários devem fazer modelos de negócios e de rentabilidade de seus produtos sem metas exageradas. "É importante conceder crédito do tamanho do consumidor, de forma consciente e sustentável", disse Mello. Ele afirmou que a Losango recebe 800 mil propostas mensais de crédito direto ao consumidor (CDC), modalidade da qual tem 24% de participação do mercado. Por meio de um sistema de credit score, 93% das respostas 'sim' ou 'não' são dadas em até oito segundos. Mello diz que a principal dificuldade é convencer os 23 mil lojistas a cuidarem do risco, oferecendo ao cliente produtos e serviços de valor agregado (como a garantia estendida, por exemplo) adequados ao orçamento.

Para isso, a empresa faz um treinamento on line e com certificação. Depois, avalia os resultados de cada loja para definir uma taxa de juros diferenciada a ser cobrada por cada ponto de venda. A loja que melhor gerencia os riscos e divide os ganhos e perdas com o banco tende a ter uma taxa menor para oferecer ao consumidor.

Cadastro positivo – Segundo o superintendente da Losango, a implementação do Cadastro Positivo já vem sendo estudada pelos bancos e deve contribuir para reduzir os juros ao consumidor. Soares, da BVS, disse que a empresa está ajudando a implementar o conceito no Brasil, o que deve levar de dois a três anos. "O Cadastro Positivo aguarda regulamentação do Conselho Monetário Nacional (CMN). A sociedade deve se organizar para conseguir a redução nas taxas. Será um instrumento importante para quem não tem como comprovar renda ou não tem carteira assinada", afirmou.

40% da renda está comprometida

A redução da Selic não deve aumentar a concessão de crédito, mas tende a aliviar o comprometimento da renda do brasileiro com as dívidas ao longo do tempo. O economista do Banco Santander, Mauricio Molan, diz que o brasileiro compromete 25% de sua renda com o crédito bancário. "É um dado preocupante porque o comprometimento da renda no Brasil é maior do que no Chile, que é de 15%", afirma o economista.

De acordo com a consultoria LCA, o total de dívidas comprometia 40% da renda dos brasileiros em maio. Os juros correspondiam a 14% desse total.

Já o professor de finanças da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP) de Ribeirão Preto, Alberto Borges Matias, lembra que o brasileiro não deixa de tomar empréstimos e financiamentos quando há aumento de juros, pois está acostumado a contratar parcelas que cabem no bolso, por prazos mais longos, sem se importar com os juros. "Com a decisão de ontem, o Banco Central sinaliza que a taxa de juros tende a cair, o que diminuirá sua carga sobre as prestações no futuro", afirmou Matias.

O professor da FEA diz que as empresas precisam se preparar para o crescimento do mercado de crédito. A estimativa é que esse estoque alcance 48% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro neste ano. Com os próximos eventos da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos no Brasil, o impacto deve ser de R$ 183 bilhões na economia brasileira, o que deve fazer o consumo das famílias saltar em R$ 5 bilhões. "Nesse processo, a sustentabilidade é a educação financeira. A sociedade precisará fazer orçamentos e conhecer os riscos", diz.

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