2 de jan. de 2011

SISTEMA FINANCEIRO PREVÊ A ABERTURA DE 100 MILHÕES DE CONTAS EM 20 ANOS

portal Correio Braziliense 02/01/2011 - Vânia Cristino

Depois de um início tímido com as contas simplificadas —aquelas movimentadas exclusivamente por cartão, sendo proibida a cobrança de qualquer tarifa para a sua abertura e manutenção —, a bancarização caminha agora para uma nova etapa. Parcelas cada vez mais significativas da população, ainda sem acesso aos serviços oferecidos pelo sistema financeiro, estão sendo absorvidas e a tendência é de que o fenômeno se acentue nos próximos 20 anos, período em que o Brasil viverá seu auge produtivo. A inclusão será movida a crédito e a produtos que agreguem tecnologia, um desafio a mais para o governo de Dilma Rousseff.

Governo e especialistas concordam que o fenômeno é irreversível. “A pista está asfaltada e pequenos ajustes e melhorias serão incorporados ao longo do tempo”, diz o chefe do Departamento de Normas do Banco Central (Denor), Sérgio Odilon dos Anjos, responsável por colocar em prática a política governamental de ampliação dos mecanismos de acesso da população ao sistema financeiro. Com a conta eletrônica, que estará disponível a partir de março deste ano, o governo espera uma grande adesão dos clientes jovens, familiarizados com as facilidades da vida moderna. “Inclusão bancária não é só para a parcela mais pobre da população. Um estudante que está tendo acesso pela primeira vez a uma conta-corrente e um jovem que conseguiu seu primeiro emprego e passará a movimentar seu salário no banco, tudo isso é inclusão bancária”, afirma.

Os horizontes a serem explorados pelos bancos são enormes, sobretudo por causa do movimento de ascensão de pessoas da classe E para as D e C. “Muita gente ainda não tem conta bancária, o primeiro passo para o relacionamento do cliente com o banco”, ressalta o vice-presidente de Negócios e Varejo do Banco do Brasil, Paulo Rogério Caffarelli.

Assim como o primeiro carro, a primeira conta bancária tem um simbolismo muito forte. Os moradores do Jardim Ingá, em Luziânia, Goiás, a 54 quilômetros de Brasília, festejam a instalação de uma agência do BB. Antes, a população precisava se deslocar até Ceilândia, na região metropolitana da capital federal, para fazer qualquer operação bancária. O motorista Antônio Valdísio, 29 anos, reconhece a importância de ter uma conta-corrente, mas sofre com a burocracia. “Abri por necessidade, mas o banco exige documentos demais”, reclama.

Júlio César Nascimento, 41 anos, auxiliar de cozinha, tem conta conjunta com a mulher. “Uso o caixa eletrônico para pagar contas e sacar dinheiro”, ressalta. Renato Costa Lima, 18. “Abri a conta para receber meu primeiro salário. Pago juros menores no cartão de crédito porque sou estudante”, diz. Renato é previdente: guarda parte do salário pensando no futuro.

Perante esse movimento de bancarização considerado irreversível, a previsão do mercado é ambiciosa: abrir 100 milhões de contas nas próximas duas décadas. Os dados computados pelo BC que o número de contas de depósitos à vista tem crescido a taxas maiores do que a população adulta. “A trajetória ascendente do número de contas movimentadas é um indício do crescimento do número de pessoas que recorrem a serviços bancários”, frisa Sérgio Odilon, do BC.

Para ele, um fator que contribuirá para a maior inclusão financeira é a oferta crescente de mais e melhores serviços simplificados — a conta salário e a conta eletrônica são provas disso —, além de uma maior capilaridade do sistema. Mesmo diante do número cada vez maior de agências e de postos de atendimento, ainda existem municípios praticamente desassistidos. Das 206 cidades atendidas por apenas um tipo de canal de acesso aos serviços bancários, 176 são atendidas, exclusivamente, por correspondentes bancários. Em outras 30, existe apenas uma agência bancária.

Brasileiros devem mais

A oferta maior de crédito vem mudando de perfil de acordo com a demanda dos consumidores, que querem financiamento de longo prazo para comprar bens duráveis e casa própria. Dados do Banco Central mostram a migração das faixas de menor valor de empréstimos e financiamento (até R$ 5 mil) para o nível intermediário (entre R$ 5 mil e R$ 50 mil) e o superior (acima de R$ 50 mil). Em junho de 2006, 37,33% do crédito concedido às pessoas físicas eram de até R$ 5 mil. Agora, são 27,34%. Ao mesmo tempo, os clientes com dívidas acima de R$ 50 mil passaram de 17,60% do total para 24,67%.

Paulo Rogério Caffarelli, vice presidente de Negócios do Banco do Brasil, afirma que o acesso ao crédito é o grande atrativo das instituições financeiras. “Primeiro, a população vai numa agência a procura de crédito. Abre uma conta-corrente para movimentar o salário. Depois, passa a procurar seguros para se proteger de diversos tipos de risco. Por último, vem a necessidade de acumulação de recursos, via poupança, capitalização ou previdência privada”, explica.

No entender do executivo, a mudança do perfil de crédito — troca de dívidas pequenas e de curto prazo por financiamento mais longo e mais elevados— não assusta. “A média está influenciada pelo financiamento de veículos e da casa própria”, diz. Para Caffarelli, o nível de endividamento do brasileiro ainda é baixo. “A população já aprendeu a gerir os recursos disponíveis e as instituições também aperfeiçoaram as análises de risco de crédito”, completa.

O BC ressalta que, com o processo de inclusão financeira, aumentou o volume de queixas contra os bancos. Mas, apesar de todas as reclamações que se avolumam nos órgãos de proteção ao consumidor, os bancos têm boa imagem perante a população. Estudo da Consultoria GfK aponta que 65% das pessoas consideram que as instituições trazem mais benefícios do problemas. O diretor de Marketing da GfK, Mário Mattos, explica que o foco da pesquisa é a contribuição do setor financeiro como instituição dentro da sociedade.

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