3 de jan. de 2011

ENTREVISTA: PAULO GUZZO, VP DE TI DA CIELO

portal IT Web 03/01/2011 - Roberta Prescott (InformationWeek Brasil)

Quem escuta o vice-presidente-executivo de tecnologia e operações da Cielo, Paulo Guzzo, dizer que, apesar de a relevância da TI para o negócio ser inegável, seu departamento sabe que seu papel se restringe a suportar a estratégia da empresa, pode ficar com a impressão equivocada de que a área tem importância diminuída por lá. Durante a entrevista exclusiva à InformationWeek Brasil, Guzzo fez questão de deixar claro de que não é a TI que direciona o negócio.

Contudo, ao sair da companhia, localizada em Alphaville, na Grande São Paulo, questionei-me se não seria modéstia do VP, de 41 anos. Afinal, durante as quase duas horas que conversamos, não faltaram menções sobre projetos arrojados que, se a TI não liderou, exerceu papel estratégico para a viabilização. Um exemplo: gerar relatórios de inteligência competitiva a partir dos dados referentes às transações. Além, lógico, de suportar o novo momento da Cielo, que deixa a exclusividade com a Visa e passa a suportar outras bandeiras.

InformationWeek Brasil — Como a mudança para a Cielo passar a aceitar diversas bandeiras afeta a TI?

Paulo Guzzo — Não complicou a operação, mas tivemos de fazer um processo de preparação para adaptar as infraestruturas sistêmica, tecnológica e de rede de captura para esta nova realidade. Mais de 170 processos foram impactados. Não digo que foi a complexidade que aumentou, mas a possibilidade de novas ofertas. Não fizemos um trabalho para ser simplesmente Mastercard, mas também outras bandeiras, como Amex [American Express]. Tivemos de preparar o ambiente para ter agilidade para esta oferta adicional e sair do contexto de condição de unicidade para suportar outras entidades de maneira equivalente.

IWB — Como está o cenário hoje?

Guzzo — Temos uma equipe preparada para o novo contexto e deixamos nossa plataforma versátil a ponto de conseguir rapidamente trazer novas possibilidades. O melhor exemplo é a Amex. Fechamos [o acordo] em 1º de julho e já temos [em 13/7, quando concedeu a entrevista] mais de 91 mil estabelecimentos credenciados. Até o fim de julho deve ser um número muito maior.

IWB — O que mudou? Foi software dentro da máquina?

Guzzo — Nós fizemos uma adaptação. Ao longo do tempo, evoluímos a plataforma de captura lá na ponta, onde roda o aplicativo no dispositivo, no POS. Em 2004, começamos um projeto no qual aportamos um browser padrão WAP e fomos aprimorando-o para que ele conseguisse suportar todas as nossas necessidades de features do produto. A realidade antes disto era que cada fornecedor de equipamento desenvolvia sua própria aplicação. O dispositivo é de segurança e é considerado na indústria de pagamento como um HSM (hardware security modem) e, quando colocamos o browser, isolamos a camada do sistema operacional. Assim, extrapolamos a camada de desenvolvimento e passamos a ter possibilidades como uma única aplicação rodar na plataforma inteira. Isto traz uma agilidade muito maior para colocar produtos e serviços no mercado, além de ser uma forma centralizada de atendimento, com ganhos de produtividade, logística e manutenção. Uma vez que estou usando um aplicativo baseado na web posso me conectar a qualquer outra empresa, que pode ser um parceiro de negócio. Por exemplo, baixar notícias. Nós fomos amadurecendo esta solução e hoje ela roda em mais de 1,2 milhão de equipamentos.

IWB — Como era antes?

Guzzo — No fim de 2008, existiam mais de 200 versões de aplicativos na rua. Agora, estamos com quatro. A complexidade ficou muito reduzida, porque conseguimos trabalhar em um ponto único de desenvolvimento.

IWB — A quebra da exclusividade aumenta concorrência. O que a Cielo vem fazendo para se manter na liderança?

Guzzo — Existem diversas ações e algumas coisas remetem à área de tecnologia, como disponibilidade e capacidade de processamento. Também revisamos, no ano passado, todas as parcerias que temos com operadores logísticos, de ação em campo e de help desk. Por exemplo, trocamos a solução de captura e temos pacotes que estabelecem o tempo levado para trocá-la. Refinamos este trabalho, trocamos um dos parceiros. A extensão territorial do Brasil é muito grande e complexa e estamos conseguindo trabalhar com índices de atendimento logístico acima de 95%.

IWB — Como?

Guzzo — Trabalhamos com inteligência de mercado envolvendo mais áreas. A TI entrou aportando infraestrutura para suportar tudo isto. Os operadores logísticos têm uma integração completa com o sistema de despacho. Levamos os últimos dois anos desenvolvendo a integração e depois a refinamos.

IWB — O que atuar com várias bandeiras muda em relação à estratégia de combate a fraudes?

Guzzo — A inteligência é a mesma. Tenho de ter interfaces diferentes com as bandeiras novas, porque com os bancos eu já falo. Geramos os alarmes direto para as instituições financeiras, que pontuam a transação segundo a possibilidade de fraude. De acordo com este valor, o banco a nega ou entra em contato com o estabelecimento comercial.

IWB — No período de 1 a 7 de julho, vocês anunciaram que foram 2,21 milhões de transações da bandeira Mastercard. Este número é crescente? O que a Cielo vem fazendo para suportar este aumento?

Guzzo — Este número é crescente. Já tínhamos feito um trabalho prévio, que pode ser constatado pelas datas críticas. Hoje, conseguimos realizar 1,8 mil TPS (transações por segundo). No pico do Natal, chegamos a quase 700 TPS, ou seja, temos um excedente computacional mais do que o suficiente para suportar. Se nada disto tivesse acontecido e se o mercado continuasse crescendo com as mesmas taxas de antes, não precisaríamos fazer nada até 2015, pois a infraestrutura suportaria.

IWB — Quando você ingressou na companhia?

Guzzo — Entrei em agosto de 1998 e acompanhei todas as mudanças. A Cielo começou a operar em março de 1996. A constituição acionaria começou em novembro de 95.

IWB — O que observou de investimento em tecnologia? Como a empresa olha a TI?

Guzzo — A relevância da tecnologia para o negócio é inegável, mas sabemos qual é o nosso papel e estamos buscando muito mais suportar a estratégia de negócio. Não quero, de forma alguma, deixar a impressão de que a TI está direcionando a empresa. Por exemplo, lançamos, há cerca de dois anos, o Agrocard, um produto desenvolvido junto com o Banco do Brasil para atender à linha de financiamento agrícola. Conseguimos prover uma solução tecnológica que descasa o processo de autenticação. Em vez de fazer, simplesmente, a captura, passamos a possibilitar que os gerentes do BB realizassem, por meio da web, o processo de venda e a confirmação com prazo diferente. Ou seja, ele faz uma pré-reserva na conta de crédito ou débito do cliente que vai receber a linha de crédito e tem até 30 dias para fazer o trâmite burocrático.

IWB — Isto mostra que a TI está próxima ao negócio.

Guzzo — Sim, estamos muito próximos. Vou te dar outro exemplo. Temos um data warehouse fantástico que estamos transformando há 1,5 ano. Tínhamos 25 terabytes de informações armazenadas e passamos a usar isto como instrumento de inteligência competitiva. Criamos análises nas quais mostramos o desempenho do estabelecimento comercial em comparação com o ano anterior, semestre, segmento, concorrentes (sem explicitar quem são), região etc. Com isto, dou um instrumento de negócio aos clientes e eles conseguem enxergar que podemos ajudá-los na estratégia deles de crescimento.

IWB — Vocês vendem este serviço?

Guzzo — Não, mas a nossa área comercial usa como ferramenta nas negociações. É um instrumento de diferenciação.

IWB — Quantos são os funcionários de tecnologia?

Guzzo — Na área de tecnologia e operações temos 340 pessoas diretas.

IWB — Qual é o gargalo do mercado?

Guzzo — O jogo está na domiciliação, ou seja, o domicílio bancário do cliente direciona o volume para um ou para outro adquirente, de acordo com a preferência de cada banco. Então, Banco do Brasil e Bradesco tendem a levar seus clientes para a Cielo e o Itaú-Unibanco, para Redecard. Agora, o HSBC está com a gente também.

IWB — Mas como este segmento vai crescer?

Guzzo — O aumento de mercado não está ligado ao número de POS, mas ao de transações. Se você olhar os números da Abecs [Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços], hoje, o mercado brasileiro como um todo — bandeiras nacionais e internacionais — tem por volta de 600 milhões de cartões. Das bandeiras principais, apenas 56% dos de crédito e 16% dos de débito estão ativos. Há um mundo para crescer. Além disto, temos uma penetração de 7% do PCI [Indústria de Cartões de Pagamento] do consumo privado do Brasil; em mercados maduros, ela chega a 20%. Então, não é apenas a quantidade de máquinas.

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