10 de jan. de 2011

ENDIVIDADO TENTA SE EQUILIBRAR ENTRE ESPECIAL E ROTATIVO

portal Economia & Negócios 10/01/2011 - Fernando Nakagawa

Começo do mês é tempo de receber salário. A alegria, porém, dura pouco: contas chegam, o dinheiro sai e, em muitos casos, a conta fica no vermelho muito rapidamente. Dados do Banco Central mostram que, mesmo com o pagamento do salário, o início do mês é o período em que os brasileiros mais usam o limite da conta corrente e o crédito rotativo do cartão de crédito.

A entrada no cheque especial se concentra entre os dias 1.º e 10, quando a média é 26,1% maior que no restante do mês. No cartão de crédito , o uso do rotativo é 59,8% maior entre os dias 5 e 15.

Levantamento do Estado que comparou a tomada de crédito em todos os dias úteis de 2009 revela que essas linhas de crédito estão sendo maciçamente usadas logo após o depósito do salário.

A situação é considerada preocupante por economistas porque indica que muitos consumidores contam com o limite da conta e o pagamento mínimo do cartão para fechar o mês e assim, pendurados no crédito, esperar até o próximo salário.

Na média, brasileiros entram diariamente no cheque especial em R$ 1,12 bilhão nos 10 primeiros dias do mês. No decorrer do mês, o dia 10 - tradicional data de pagamento de salários - é que concentra o maior uso do limite: R$ 1,48 bilhão. O valor é exatamente o dobro da data em que o crédito é menos usado, 24, cuja média é de R$ 737 milhões.

No cartão, a concentração é um pouco adiante: entre 5 e 15. Nesse período, operações como o uso do rotativo e o saque emergencial somam média diária de R$ 836,6 milhões. O valor é quase 60% maior que o visto no restante do mês. O ápice é no dia 12, quando a média atinge R$ 1,05 bilhão. O valor é quatro vezes maior que o movimento do dia 24, o menor valor do mês: R$ 274,8 milhões. Curiosamente, o menor uso do cheque especial e do rotativo do cartão acontecem no mesmo dia 24 de todo mês.

Bola de neve. "O comportamento é preocupante porque revela um estilo de vida em que as pessoas precisam se endividar para sempre. São consumidores que têm confiança de que receberão o salário no próximo mês e, por isso, tomam esses empréstimos sistematicamente logo após receber o salário", diz o professor de finanças do Insper, Ricardo José de Almeida.

Na teoria, consumidores concentram o vencimento das contas em datas próximas ao salário para que haja "casamento" entre receitas e despesas. Mas, na prática, é bem diferente. Juntas, as despesas correntes somam valor maior que a renda e, por isso, é preciso recorrer sempre ao cheque especial mesmo com o salário recém depositado.

Logo depois, o problema cresce porque chega o extrato do cartão com todas as compras do mês anterior. E, como a conta já está no vermelho, o jeito é pagar o mínimo e usar o rotativo.

Ou seja, as datas podem até coincidir, mas isso não resolve a situação porque são os valores que estão sempre descasados.

"Muitos clientes encararam com normalidade usar o cheque especial e pagar o mínimo do cartão todo mês. Isso não é adequado porque se houver qualquer imprevisto ou ele for demitido vira uma bola de neve", diz o superintendente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Marcel Solimeo.

Alto custo. Mesmo que não haja os imprevistos e o consumidor continue empregado, essa operação tem um custo, lembra Solimeo. O cheque especial é a segunda linha de crédito mais cara oferecida pelos bancos: juro médio de 163,6% ao ano.

No cartão de crédito é ainda pior: 238,3% anuais, simplesmente a mais cara operação de empréstimo do sistema financeiro. "O problema mora aí. Como usam todo mês e essas operações têm os maiores juros do País, a conta vai se acumulando e pode ficar inviável continuar tocando a vida com o cheque especial e o cartão", alerta o professor do Insper.

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