25 de fev. de 2011

CARTÕES CRESCEM, APESAR DA ALTA DO JURO

jornal Valor Econômico 25/02/2011 - Carmen Lígia Torres

As medidas macroprudenciais anunciadas pelo governo federal para segurar a inflação não devem afetar substancialmente o setor de meios de pagamento por cartões, cadeia composta por empresas de bandeiras, de emissores e de credenciadores que ligam o consumidor final aos lojistas. Taxas de juros mais altas e pequenas retrações no crédito podem ter um impacto indireto, mas não a ponto de comprometer o crescimento esperado para 2011, situado na faixa de 20%, para um faturamento de R$ 538,3 bilhões em 2010, considerando cartões de débitos, créditos e plásticos de redes e lojas.

A participação do crédito no total de transações é quase o dobro dos débitos: 57% em 2010, ante quase 30% de débitos. Os cartões de redes e lojas ficam com cerca de 12% no total.

"Mais importante do que os juros são fatores como a manutenção de emprego e renda, além da entrada de novos consumidores no mercado, o que vem ocorrendo com a mobilidade social nas classes intermediárias C e D", analisa Gilberto Caldar, presidente da Mastercard Brasil e Cone Sul.

Pode haver um impacto indireto, lembra Rômulo Dias, presidente da Cielo. "O bolso do consumidor é um só e o menor consumo sempre impacta o setor", diz. No entanto, colocando na balança os fatores favoráveis e desfavoráveis, a análise é de que o crescimento da população com acesso a cartões e as estratégias das empresas para conquistar usuários deverão compensar em muito os fatores macroeconômicos negativos.

O uso de cartões como meio de pagamento, no Brasil, ainda é considerado baixo pelos representantes do setor. Atualmente, 23% do consumo das famílias são pagos com cartões, mas o índice pode dobrar, se a referência forem as compras dos americanos: 45%.

"O segmento é o segundo mercado financeiro que mais cresce no Brasil, só atrás do crédito imobiliário", diz Paulo Caffarelli, vice-presidente da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs). Segundo ele, a indústria de cartões é nova no Brasil e é preciso superar resistências.

Cafarelli explica que 2010 foi um ano especial para o setor, rumo à consolidação. Algumas regras estabelecidas no ano passado são consideradas um marco definitivo. A mais importante delas, o fim da exclusividade no relacionamento entre bandeiras e credenciadoras, tende a dar uma outra cara ao mercado, conforme analisa. Até início do ano passado, Redecard e Cielo (antiga VisaNet) detinham quase 90% do mercado de credenciamento de lojistas para cartões de crédito e débito.

Com a abertura do mercado, o Santander lançou, no começo do ano, mais um concorrente forte: a GetNet, que passou a concorrer com as duas maiores. "Com o mercado de credenciamento aberto a agentes multibandeiras, o modelo de negócios das principais credenciadoras tende a se modificar", registra Cafarelli.

Entre as mudanças estão o surgimento de novas bandeiras, além das já conhecidas Mastercard, Visa, Diners e American Express. Em abril, uma nova bandeira passou a fazer parte do mercado, Elo, que já foi uma das primeiras do mercado brasileiro na década de 70. Renasce, agora, pelas mãos do Bradesco e Banco do Brasil, unidos em uma holding para integrar parte das suas operações de cartões.

As bandeiras não revelam sua participação de mercado. A recém-criada Elo, no entanto, pretende conquistar 15% do mercado, mais de 100 milhões de cartões, para uma base estimada em 800 milhões. Uma das estratégias do Bradesco e Banco do Brasil para a criação da Elo foi o aumento de participação na Cielo e na Visa Vale, por meio da compra de fatias que estavam nas mãos do Santander Espanha. Os bancos ficaram, juntos, com 57,3% da Cielo e 90% da Visa Vale. Na época do lançamento da Elo, o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, comentou que "seria impossível se lançar no negócio se não houvesse o fortalecimento do núcleo de controle na maior rede de adquirência no país".

A abertura do mercado já levou, também, à queda da taxa líquida de desconto e do preço do aluguel dos terminais de captura de operações com cartões (POS - point of sale) instalados nos lojistas. Analistas desse mercado indicam que a queda foi de 1,21% para 1,1% para a Cielo e 1,08% para a Redecard.

O valor dos aluguéis dos POS chegou, em fevereiro, à média de R$ 50,34 para a Redecard, uma queda de 26% em relação ao quarto trimestre do ano passado. O balanço da Cielo de 2010 já mostra a queda da participação da receita de aluguel dos terminais no total da receita operacional. Em 2009, esse item representou 27,7% do total, e em 2010 participação caiu para 26,2%. Outra novidade foi a mudança no comando da Redecard. Roberto Medeiros deixa a empresa dando lugar a Cláudio Yamaguti, que comandava o Itaú Unibanco no Paraguai.

Competição se dá em várias frentes

Na disputa pelo mercado de cartões pós-abertura de 2010, a competição está se dando em diversas frentes, envolvendo desde a capacidade tecnológica para instalação de terminais em lojas, expansão de soluções de pagamento em equipamentos móveis, passando por estratégias de fidelização, tanto de lojistas como de consumidores, capilaridade e até qualidade nos serviços de atendimento.

Para que qualquer uma das estratégias surta efeito, no entanto, Gilberto Caldar, presidente da Mastercard lembra que "é preciso estar dentro da carteira do consumidor". A partir daí, as promoções e outros incentivos farão a diferença. "O trabalho deve ser feito junto a todos os quatro públicos ", diz Caldar. A Mastercard, presente em 31,7 milhões de estabelecimentos no mundo, e contando com 127 milhões de unidades na região da América Latina e Caribe, lançou o primeiro projeto de pagamentos por celular, o MasterCard Mobile, em parceria com Itaú, Vivo e Redecard, além de ter fechado acordo com a Telefônica para criação de uma joint-venture de meios de pagamentos móveis em 12 países da América Latina.
Em 2010, o volume de compras registrou um volume de compras (América Latina e Caribe) de US$ 125 bilhões, mais 22,4%. O número de transações de compra e saque atingiu 2,8 bilhões, mais 17,4%.

Pelo lado das credenciadoras, a Cielo, que fechou 2010 com crescimento de 22,3% em transações, agiu no ambiente de competição ampliando investimentos em marketing, adaptando sistemas tecnológicos, promovendo ajustes na área comercial e expandindo a área de call center. Foram renegociados contratos com 70% dos grandes clientes, com redução nas taxas de desconto, que é a tarifa por transação cobrada dos estabelecimentos comerciais, excluindo-se a fatia que vai para os bancos. Segundo Rômulo Dias, presidente da empresa, a renegociação tem um limite. "A companhia vai privilegiar a rentabilidade, sem buscar a reconquista das posições perdidas a qualquer custo."

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