14 de mar. de 2011

CONSIGNADO CURTO DÁ GÁS A LINHA CARA

jornal Valor Econômico 14/03/2011 - Adriana Cotias

O crédito com desconto em folha de pagamento ficou mais curto e caro e está empurrando tomadores para linhas de maior risco. Com a restrição de capital imposta aos bancos em dezembro para operarem com prazos acima de 36 meses, consumidores que costumavam se refinanciar no consignado antes de o contrato vencer, tomando mais dinheiro tão logo tivessem espaço liberado na renda - a chamada "pedalada" -, agora encontram limites a tal estratégia. O resultado dessa desalavancagem forçada transparece nas estatísticas de crédito do Banco Central (BC) que, em janeiro, identificava aceleração da concessão nas linhas mais caras, como cheque especial e cartão de crédito, em ritmo acima do sazonal.

No Banco do Brasil (BB), que detém a folha de servidores públicos federais, estaduais e municipais, os empréstimos com desconto em folha, que antes eram feitos por até 96 meses, agora se restringem a 36 meses. O Bradesco, que tem oferta por até 60 meses em algumas praças, também tem estimulado o prazo de até 36 meses, mais barato para o tomador. O mineiro Bonsucesso, especializado no consignado, não alterou a política de concessão em 60 meses, mas fez ajustes no "spread" - a diferença entre o custo de captação e a taxa de aplicação dos recursos -, de 6% ao ano para um intervalo entre 9% e 12%.

Só o encurtamento já limita a capacidade de refinanciamento do tomador, explica o diretor de crédito do BB, Walter Malieni. "Progressivamente, o crédito passou a comprometer mais renda do que há dois meses, e o consumidor passa a ter que amortizar mais juros em menos tempo." Conforme exemplifica, o tomador contumaz, que podia emprestar do banco R$ 1 mil por 96 meses, agora dispõe de apenas R$ 400 no consignado em 36 parcelas. O que sobra dessa conta vai rolar com o seu banco de maior relacionamento e nas modalidades mais à mão.

O Bradesco preferiu ajustar o preço a reduzir formalmente o prazo das operações de consignado, mas na hora do fechamento do contrato há a orientação ao cliente de que a contratação em até 36 meses custa menos, diz o diretor de empréstimos e financiamentos da instituição, Octavio de Lazzari Junior.

Para o vice-presidente de risco de crédito do Santander, Oscar Rodriguez Herrero, o maior requerimento de capital no consignado vai inibir justamente o refinanciamento de operações muito longas que a concorrência no segmento acabou instituindo no mercado nos últimos anos. "Pagar um empréstimo e pegar outro depois, em vez de 'pedalar', é melhor para o cliente também, isso ajuda na disciplina", diz. Com sobra de capital por conta da oferta de ações realizada no fim de 2009, quando levantou R$ 14,1 bilhões, a instituição não alterou sua política na modalidade, que chega a 60 meses para beneficiários do INSS.

O aumento do peso das operações de consignado com prazo superior a 36 meses no cálculo do capital dos bancos, que passou de 75% para 150%, não pode ser considerada trivial, merece monitoramento da estrutura de capital das instituições de nicho e vai determinar mudanças importantes no setor, pondera Paulo Henrique Pentagna Guimarães, presidente do Bonsucesso. Com folga patrimonial graças a uma emissão de dívida subordinada de US$ 125 milhões feita no exterior no fim de em outubro, o banco pôde manter o prazo de 60 meses no consignado, carro-chefe das suas operações. Mas além de ajustar os custos na ponta, o banco tomou algumas medidas corretivas. Reduziu a comissão paga a certos correspondentes bancários e até deixou de atender alguns convênios que, por terem inadimplência elevada ou limitação de taxa, não produziam a rentabilidade desejada.

Mesmo assim, a percepção é de que o Bonsucesso conseguiu ganhar mercado no primeiro bimestre, em função do recuo da concorrência. Os desembolsos no período chegaram a R$ 320 milhões, mais do que o dobro do concedido no mesmo período do ano passado.

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