21 de mar. de 2011

APOSTA NOS EMERGENTES É UM RISCO PARA O CITI

jornal Valor Econômico 21/03/2011 - Donal Griffin (Bloomberg News)

Vikram Pandit, que conduziu o Citigroup em meio ao pacote de resgate do governo de US$ 45 bilhões, apostou o futuro do banco nos mercados emergentes - justamente quando os investidores estão se retirando.

O Citigroup, terceira maior instituição de crédito dos Estados Unidos em ativos, agora ganha mais da metade de seus lucros em países em desenvolvimento, afirmou o executivo-chefe Pandit em conferência, no dia 9 de março, em Nova York. O banco ampliou seus ativos na América Latina e Ásia em 16%, para mais de US$ 470 bilhões em 2010, ganhando mais clientes em países como Brasil, México e Índia.

Em junho de 2009, Pandit, de 54 anos, previu que o Citigroup se tornaria a "maior empresa de serviços financeiros em mercados emergentes", uma aposta de longo prazo que poderia ser acertada, se os índices de crescimento continuarem nas alturas. A expansão, que coincide com dois informes de autoridades reguladoras questionando a capacidade da empresa em administrar riscos, poderia tornar o Citigroup mais vulnerável do que os demais bancos dos EUA.

Com a inflação em alta ameaçando o crescimento dos países em desenvolvimento, os investidores retiraram mais de US$ 21 bilhões de fundos de renda variável de mercados emergentes, o equivalente a 22% do fluxo de entrada em 2010, segundo a empresa de análises financeiras EPFR Global. O índice MSCI EM, que acompanha as ações de 812 empresas em países como Brasil e Índia, caiu 2,9% no acumulado deste ano, depois de mais de dobrar nos dois anos anteriores.

O Citigroup, que no passado teve tropeços no Japão e América Latina, cujos custos foram de pelo menos US$ 4 bilhões em baixas contábeis, atualmente opera em mais de cem países. Possui mais de 50 mil funcionários na Ásia e 28 milhões de clientes na América Latina, de acordo com o site do banco nova-iorquino.

Em fevereiro, Pandit, que não quis se entrevistado para esta reportagem, reconheceu em discurso em Nova York que muitas economias emergentes vêm "operando com sua capacidade [máxima] ou perto disso e que há o risco de sobreaquecimento".

O executivo, no entanto, arquitetou sua estratégia nos países emergentes com o objetivo de longo prazo de aproveitar a ascensão de uma nova classe média. Os consumidores na Ásia em desenvolvimento podem gastar US$ 32 trilhões em 2030, em comparação ao consumo de US$ 4,3 trilhões divulgado no fim de 2008, segundo informe do Banco de Desenvolvimento Asiático (ADB, na sigla em inglês), de agosto de 2010.

As ações do banco caíram 12% desde 14 de janeiro, quando atingiram a maior cotação em 16 meses, em parte pela "desaceleração potencial nas economias emergentes", segundo escreveu o analista Richard Bove, da Rochdale Securities, em informe de 2 de março. Bove recomenda a "compra" das ações do Citigroup. Os papéis do Standard Chartered Plc, um dos rivais de Pandit pelo domínio bancário nos mercados emergentes, caíram 6,8% no mesmo período, enquanto os do HSBC Holdings Plc recuaram 8,4%.

O Citigroup registrou lucro líquido de US$ 10,6 bilhões em 2010, primeiro ano rentável do banco desde que Pandit se tornou executivo-chefe em dezembro de 2007. Os resultados foram impulsionados pela área de banco ao consumidor na Ásia e América Latina, onde o lucro líquido mais do que dobrou para US$ 4,1 bilhões, graças ao aumento na concessão de créditos, em comparação a uma queda de 17% nos negócios nos EUA.

Na América Latina, sob o comando de Manuel Medina-Mora, chefe de banco ao consumidor nas Américas, o Citigroup elevou a concessão de créditos imobiliários residenciais e comerciais em 31%, para US$ 16 bilhões, no ano passado, em relação a 2009.

"Sempre que vejo taxas de crescimento que superam substancialmente a média, é uma bandeira vermelha", disse David Knutson, analista sênior, em Chicago, da Legal & General Investment Management America, que administra US$ 18,5 bilhões, incluindo US$ 85,3 milhões, em bônus do Citigroup, segundo dados da Bloomberg. "É sinal de que você precisa examinar como se está alcançando esse crescimento."

A expansão liderada por Pandit na carteira de créditos do Citigroup nos mercados emergentes ocorre enquanto o banco está sujeito a um memorando de entendimento (MOU, na sigla em inglês) de um dos reguladores americanos, o Gabinete de Controladoria da Moeda (OCC, que supervisiona os bancos nos EUA). Um MOU é uma exigência de cumprimento em que o banco se compromete a solucionar algo que desagradou aos reguladores.

O MOU está em vigor desde junho de 2008 e refere-se a "fragilidades na gestão de risco", de acordo com informe da Comissão de Investigação da Crise Financeira (FCIC), dos EUA, divulgado em janeiro.

"Qualquer MOU me dá dor de estômago", disse Knutson, da Legal & General. "Isso é agravado no caso do Citibank, quando se tem uma instituição que vai, não do Maine ao Alasca, mas que esse estende globalmente."

Em janeiro de 2009, o Fed regional de Nova York conferiu uma nota de vigilância ao Citigroup de 4, em uma escala de 1 a 5 (5 sendo a pior nota), por "fragilidades substanciais na capacidade da firma e de seus sistemas para monitorar suas vulnerabilidades-chave", segundo documento divulgado pelo FCIC.

"Desde que Vikram Pandit se tornou executivo-chefe, o Citi agregou recursos e talentos significativos para a equipe de gestão de risco e remodelou seus processos e a estrutura de risco", disse Shannon Bell, porta-voz do banco, em comunicado por e-mail. "Como resultado acreditamos ter a cultura, procedimentos e processos de gestão de risco adequados em vigor para administrar os planos de crescimento pelo mundo."

Um teste da estratégia de Pandit poderá acontecer no Brasil, maior economia na América Latina, que cresceu 7,5% no ano passado e onde as autoridades econômicas agiram recentemente no sentido de evitar uma bolha de crédito. O banco ampliou sua exposição internacional no Brasil em 64%, para US$ 16,9 bilhões ano passado, de acordo com documentos encaminhados à agência competente.

A unidade brasileira do Citigroup é dirigida por Gustavo Marín, que se reporta a Medina-Mora. Ela emprega mais de 6 mil pessoas, segundo o site do banco. Através de sua subsidiária Credicard, o Citigroup agora controla entre "7% e 8%" do mercado de cartões de crédito, disse Medina-Mora em entrevista em dezembro, em Nova York.
"Nós vemos o sistema financeiro brasileiro como muito sólido, muito saudável, muito bem supervisionado", disse Medina-Mora, em dezembro. "Nossa operação lá está indo muito bem - em expansão, crescendo com o crescimento do país."

Naquele mesmo mês, enfrentando seus mais altos níveis de inflação em cinco anos, o banco central brasileiro tomou medidas para reduzir os empréstimos ao consumidor. A inadimplência inferior a 90 dias nos empréstimos ao consumidor subiu para 5,9% em janeiro, de 5,3% em dezembro, informou o banco central. Os preços médios das casas em São Paulo e no Rio de Janeiro saltaram 81% e 99%, respectivamente, nos últimos três anos, segundo a Fundação Instituto Pesquisas Econômicas.

Os empréstimos do Citigroup no Brasil são "mais arriscados que os de seus concorrentes", porque 70% de seus empréstimos no varejo são vinculados à operação de cartões de crédito, segundo relatório divulgado ontem pela empresa de classificação de crédito Standard & Poor's, confirmando a perspectiva estável do banco.

"Embora o banco cumpra rigorosas diretrizes e políticas definidas por comissões [internas], seu nível geral de ativos com desempenho insatisfatório têm sido historicamente superior à média no setor, assim como os prejuízos vinculados à concessão de crédito", escreveu Vitor Garcia, um analista de crédito.

O dinheiro ganho com clientes brasileiros do banco deve compensar o aumento da inadimplência, disse Simon Nocera, ex-economista do Fundo Monetário Internacional e um dos fundadores do fundo de hedge Lumen Advisors LLC, de San Francisco, que não possui ações do Citigroup. Com as taxas de juros locais em mais de 11%, um banco brasileiro pode obter retorno aproximado de 2,5% sobre seus ativos, disse ele. Isso é cinco vezes o que a operação bancária varejista do Citigroup na América do Norte conseguiu em 2010.

Um país rico em commodities, como o Brasil, continuará a prosperar se os preços do ferro, aço e petróleo prosseguirem em alta devido à demanda chinesa, afirmou Nocera.
"Estou confiante em que os preços das commodities vão continuar a subir nos próximos anos", disse Bove, analista da Rochdale Securities. "Se você me disser que os preços das commodities vão cair, eu ficaria muito preocupado com o Brasil, com a América Latina e com a posição do Citigroup nessas regiões".

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