jornal Valor Econômico 21/06/2011 - Aline Lima
A exigência de mais capital dos bancos que operam linhas de financiamento de longo prazo a pessoas físicas começa a ser efetivada em julho e as instituições de pequeno e médio portes já sentem seus efeitos, enquanto buscam se adaptar. O Bonsucesso, por exemplo, especializado em crédito consignado, diminuiu o ritmo das concessões de empréstimos em 30% de janeiro a maio deste ano, comparado com igual período de 2010, para algo em torno de R$ 80 milhões mensais. O BMG, líder desse segmento, reduziu em cerca de 15% sua produção no mesmo intervalo de tempo - a média mensal de R$ 700 milhões caiu para R$ 600 milhões.
Em dezembro, o Banco Central ampliou o requerimento de capital para operações de consignado com prazos superiores a 36 meses de 11% para 16,5% do valor dos empréstimos concedidos. A medida vale para créditos contratados a partir de dezembro, mas a alocação do capital começa a valer em julho. No caso dos financiamentos de veículos, o BC estabeleceu uma espécie de tabela que leva em consideração tanto o prazo do empréstimo como o valor de entrada dado pelo comprador para que o aumento seja (ou não) aplicado.
A estratégia dos bancos para tentar minimizar os impactos da nova regra varia conforme a estrutura de capital de cada uma das instituições.
O BMG apresentava, em março, índice de Basileia (que mede a relação entre o capital e o volume dos ativos) de 14,14%. O mínimo exigido pelo Banco Central (BC) é de 11%. "É preciso encontrar alternativas de criação de capital", reconhece Ricardo Gelbaum, diretor executivo do BMG, completando que o banco está sempre olhando para caminhos estratégicos. "O mundo passa por consolidação", diz. O BMG também conta com um espaço para emissão de dívida subordinada de aproximadamente US$ 200 milhões, recursos que entram como capital de nível 2. Uma opção analisada é lançar letras financeiras subordinadas.
O Bonsucesso tinha, em março, índice de Basileia mais folgado que o do BMG, de 17,9%. Mas nem por isso o cenário está muito mais confortável. "Estamos diminuindo o volume de produção de crédito, dando prioridade aos contratos mais rentáveis", afirma Paulo Henrique Pentagna Guimarães, presidente do Bonsucesso.
Na opinião de especialistas, os bancos com atuação voltada para o crédito consignado tendem a sofrer mais para se ajustar a prazos mais curtos do que aqueles especializados em financiamento de veículos. Como a parcela do crédito consignado só pode atingir um máximo de 30% do salário do tomador, uma redução de prazo implica, necessariamente, em redução do volume de empréstimo. Pentagna, do Bonsucesso, diz que mesmo assim vem tentando reduzir alguns convênios para 36 meses. "Não podemos continuar com o mesmo ritmo de originação."
Além de ter de comprometer mais capital para conceder crédito, os bancos também dependem da capacidade de captar recursos para continuar girando a máquina. O panorama, também nesse caso, não é dos mais animadores. Retração no mercado de cessão de crédito e encarecimento das taxas de captação, aqui e lá fora, ampliam os desafios dos bancos pequenos e médios que operam linhas de varejo.
O Bonsucesso tem centrado esforços na criação de fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs), tanto para levantar recursos como para aliviar o índice de Basileia. No início do mês, seu FIDC de crédito consignado de R$ 200 milhões, lançado em fevereiro de 2010, recebeu uma segunda tranche de R$ 220 milhões. A previsão de Pentagna é completar o programa de captação até setembro, que ao todo deve alcançar R$ 1 bilhão.
"A cessão de créditos para FIDC dá tranquilidade ao banco porque o risco não fica retido em balanço", explica Pentagna. Dependendo do volume de ativos de crédito a ser produzido, o novo aporte de R$ 220 milhões no FIDC do Bonsucesso pode significar um ponto percentual de folga em seu índice de Basileia. "Existe ainda a vantagem de casar o prazo de ativos e passivos, além da moeda."
O Bonsucesso segue a fórmula do Cruzeiro do Sul. O banco da família Indio da Costa encerrou o primeiro trimestre de 2011 com uma carteira de crédito consignado de R$ 6,544 bilhões, sendo que R$ 1,492 bilhão em ativos estavam contabilizados no balanço e R$ 5,051 bilhões em cotas subordinadas de FIDCs. "Temos boa capitalização para continuar operando", diz Fausto Guimarães, superintendente de relações com investidores do Cruzeiro do Sul.
O banco fez uma emissão de US$ 400 milhões de dívida subordinada em setembro do ano passado e seu índice de Basileia atingiu 18,9% no primeiro trimestre. Desse total, o banco ainda não pode aproveitar cerca de US$ 100 milhões como capital porque, antes, precisa crescer o seu patrimônio líquido se quiser ganhar mais espaço no capital de nível 2.
Guimarães minimiza a questão do maior requerimento de capital. "Fizemos uma simulação dos impactos da nova exigência de capital para toda nossa carteira, em vez de apenas os contratos firmados a partir de dezembro, e a Basileia ficaria ainda em 15%", diz Guimarães. O cálculo não leva em conta as carteiras cedidas aos FIDCs.
Dentre os bancos pequenos e médios que operam com consignado, o Paraná Banco é o que se encontra em situação mais tranquila em termos de capital, com índice de Basileia de 32% ao fim do primeiro trimestre. "O fato é que a medida, para nós, foi benéfica", diz Mauricio Fanganiello, gerente de relações com investidores. "Não temos preocupação até meio do ano que vem e vamos aproveitar as oportunidades."
Os dados do BC sobre operações de crédito no sistema financeiro mostram crescimento da oferta de empréstimo pessoal - na qual o consignado detém participação de 59,7%. A média de concessões diárias em abril ficou 20,6% maior do que em dezembro e 9,8% superior a abril de 2010. Essa expansão, no entanto, tem sido puxada pelos grandes bancos de varejo, cada vez mais atuantes nessa modalidade, especialmente para aposentados e pensionistas do INSS.
Para Érico Sodré Quirino Ferreira, presidente da Associação nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi), as estratégias de atuação estão mais ligadas à situação de Basileia de cada instituição do que a seu porte. "Se o índice não está próximo do mínimo exigido pelo BC, não existe problema em ser pequeno, médio ou grande", afirma. "Se eu tivesse folga de Basileia, aproveitaria para ganhar 'market share'", diz Ferreira, que também preside a financeira Omni.
Um comentário:
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