jornal Valor Econômico 10/12/2010 - Adriana Cotias
Na migração das informações de recebíveis de cartões comprometidos com alguma operação de crédito para a Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP), bancos e credenciadoras se confrontaram com uma aparente "reserva de mercado" pelo Bradesco. Segundo o presidente da Redecard, Roberto Medeiros, 90% da base de lojistas com relacionamento com a instituição apareceu "travada" no Sistema de Controle de Garantias (SCG), fatia muito acima da média do mercado, que ronda os 40%, 45%. Isso dificultou que a companhia passasse a antecipar para o lojista os valores referentes aos cartões da bandeira Visa, que passaram a ser capturados na sua rede no 1º de julho.
A Redecard recorreu à CIP e pediu uma revisão. "Conversamos também com o Bradesco, já estamos fazendo antecipação de Visa, mas a porcentagem travada ainda é alta", comentou em recente encontro com analistas e investidores. "Não é vantagem para o banco pagar trava para cliente que não tem transação financeira."
O Bradesco não comenta o caso, mas, pelas notas explicativas anexas às demonstrações financeiras da Cielo, a credenciadora obteve receitas de R$ 4,2 milhões neste ano, até setembro, com o serviço de trava bancária prestado ao Bradesco, um dos bancos que compõem o seu bloco de controle. Comparativamente, o Banco do Brasil, o outro sócio, rendeu R$ 777 mil com a mesma transação.
De acordo com Medeiros, quando o SCG foi desenhado, ficou acordado que os bancos não transfeririam para a CIP a chamada "trava relacional" e que ela existiria exclusivamente para garantir operações de crédito efetivamente pactuadas com os lojistas. "Clientes com grandes volumes de Visa acabam tendo uma pressão sobre os 'spreads' enorme e não têm como diluir isso."
Criado a toque de caixa pelos bancos, bandeiras e credenciadoras, o SCG surgiu da necessidade de se ter, sistemicamente, um modelo de gestão de garantias que assegurasse a continuidade do financiamento bancário baseado no fluxo de pagamentos com cartões de crédito. Desde o 1º de julho, quando os estabelecimentos comerciais passaram a ter liberdade para receber suas vendas com Visa e MasterCard em qualquer uma das redes existentes, havia o risco de ele mudar de credenciadora no meio do caminho e aquela garantia travada por Cielo ou pela Redecard perderia a validade.
Não é de hoje que o SCG causa algum ruído. Outros bancos que passaram a atuar na linha de antecipação recebíveis de cartões com maior ênfase, casando pacote de conta corrente com credenciamento, também encontraram dificuldades para avançar nas bases originadas pelo Bradesco. Um executivo comentou que algo que não ficou claro, por exemplo, é o preço que as credenciadoras cobram pela trava bancária, especialmente das instituições financeiras que compõem os respectivos grupos de controle. Essa questão, segundo o presidente da Cielo, Rômulo Dias, está sendo negociada com os entes do sistema para que haja uma relação de maior equilíbrio.
Como a Cielo não fazia antecipação de recebíveis até 2008, Bradesco e BB é que financiavam os lojistas, com base nos fluxos de cartões de crédito. Nessa linha, a credenciadora vem avançando paulatinamente. No terceiro trimestre, antecipou aos clientes R$ 2,7 bilhões, o equivalente a 6,4% das transações de crédito, em comparação aos R$ 6,8 bilhões da Redecard, com uma fatia de 22,2%. Segundo o presidente da Cielo, apesar de haver essa questão da "base legada" travada, não há razão para a empresa não ter dentro de três anos uma participação equivalente à de outros participantes do mercado. "Mas ficou mais intensa a competição com os próprios bancos que podem oferecer até oito vezes o valor dos recebíveis", disse Dias.
A Febraban, em nota, informou que o SCG está em pleno funcionamento, e foi mais um projeto bem-sucedido. "Como toda implantação envolvendo muitas partes houve necessidade de alinhamento de bases de informações, o que causou alguns contratempos pós-implantação, mas está tudo absolutamente sob controle."
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