jornal Valor Econômico 19/08/2011 – Aline Lima
À sombra do crédito rotativo, uma modalidade ainda pouco difundida começa a dar sinais de força na indústria financeira. Trata-se de empréstimo pessoal por meio do cartão de crédito, produto que, além de fazer as vezes de linha adicional ao limite pré-aprovado do cartão, está sendo oferecido, em alguns casos, também como alternativa ao caríssimo juro do rotativo.
Itaú Unibanco e Santander vêm intensificando a oferta de empréstimo pessoal por meio do plástico para expandir suas carteiras de crédito principalmente entre não-correntistas. A modalidade é também alvo de interesse do HSBC, que estuda o lançamento do produto neste segundo semestre, por meio de sua financeira Losango.
Na pioneira Credicard, a linha de crédito pessoal já responde por 39% do saldo de recursos financiados (o rotativo por 55% e os acordos de parcelamento, por 6%), segundo Leonel Andrade, presidente da empresa. No fim de 2008, o rotativo representava 95% do estoque financiado da administradora de cartões do Citi e os acordos de parcelamento, os 5% restantes.
"O rotativo não é um negócio no qual eu apostaria no futuro", sentencia o presidente da Credicard. Andrade acredita que o rotativo tende a continuar perdendo espaço nos números da empresa. A expectativa é que, até o fim de 2012, a balança se inverta e cerca de 60% do saldo financiado na Credicard seja proveniente da linha de crédito pessoal e 40% do rotativo.
No Itaú Unibanco e Santander, o foco não está direcionado a clientes que costumam fazer uso constante do rotativo, e sim àqueles com potencial para gastos superiores aos volumes usualmente despendidos por mês no cartão. Na mira estão principalmente não-correntistas, já que os correntistas podem acessar linhas de empréstimo pessoal pela internet, caixas eletrônicos ou nas agências.
"O cartão foi a única forma encontrada de fazer crédito pessoal para esse público", explica Fernando Telles, diretor da Itaucard. Embora não revele o volume financiado pela linha, o executivo diz que o montante cresce de forma expressiva desde 2009, quando o produto começou a ser oferecido pela Itaucard.
Parte do desempenho é puxado pelo elevado valor dos desembolsos. O tíquete médio do empréstimo pessoal por meio dos plásticos Itaucard é de R$ 3,5 mil. O prazo é de 24 meses, podendo chegar a 36 meses no caso de correntistas. Segundo Teles, 80% dos tomadores são não-correntistas do Itaú Unibanco, e a maioria tem perfil de alta renda.
A carteira de cartão de crédito do Itaú Unibanco, na qual estão incluídas as operações de empréstimo pessoal feitas por meio do cartão, apresentou expansão de 22,8% nos 12 meses encerrados em junho, alcançando R$ 34,555 bilhões.
O Santander oferece empréstimo pessoal por meio do cartão de crédito desde 2009, mas foi em 2010 que o banco passou a impulsionar o produto comercialmente, por meio de anúncios via mala direta e telemarketing. As campanhas muitas vezes estão atreladas a ofertas de produtos, cujas condições são negociadas previamente em acordos entre o Santander e redes de varejo.
A saldo de empréstimo pessoal vinculado ao cartão triplicou de tamanho no Santander entre junho de 2010 e junho de 2011, segundo Walter Antonio Savaglia Neto, gerente executivo de cartões do banco. Ele não informa o volume financeiro, mas diz que o valor é significativo. A carteira de cartão de crédito do Santander cresceu 32% entre junho de 2010 e junho de 2011, para R$ 11,7 bilhões.
Batizado de SuperCrédito, o empréstimo pessoal do Santander é oferecido a não-correntistas como uma linha adicional, que não compromete o limite do cartão de crédito e tem pagamento parcelado em até 36 vezes. "Incremento meu relacionamento com o cliente e ainda o mantenho na base por muito tempo", observa Savaglia Neto.
Tanto no Santander como no Itaú Unibanco, os critérios para a escolha dos clientes que irão receber proposta de empréstimo pessoal pelo cartão parecem convergir para um perfil de tomador financeiramente disciplinado, apesar de propenso a consumir mais. "Procuramos identificar na base pessoas adimplentes", diz Teles, da Itaucard. "O rotativo tem uma natureza distinta do crédito pessoal, pressupõe uma decisão temporal."
O Santander está atrás de clientes com um comportamento de risco "adequado" ao produto, segundo Savaglia Neto. "Não encontro relação direta entre o crédito pessoal e o rotativo", afirma. O executivo reconhece, porém, que as taxas praticadas pelo rotativo estão "fora da realidade". "Enfrentamos queda no volume de financiamentos pelo rotativo e isso é o que queremos", diz Savaglia Neto.
A estratégia de substituição paulatina do rotativo pelo crédito pessoal pressionou, num primeiro momento, a receita da Credicard. De acordo com Leonel Andrade, houve uma queda de 10% da receita total em 2009, quando o crédito pessoal começou a ser oferecido pela Credicard, na comparação com 2008. A taxa média de juro da linha é de 5,3% ao mês, enquanto no rotativo esse valor sobe para 11,5%.
O crescimento da base de clientes da Credicard, atualmente de sete milhões, e do volume movimentado pelo crédito pessoal - a linha pode chegar a um valor até três vezes superior ao limite pré-aprovado do cartão - compensou, posteriormente, a migração "provocada", em parte, pela Credicard. A receita da empresa cresceu 10% entre 2010 e 2009 e 20% no primeiro semestre de 2011 ante o igual período do ano passado, segundo Andrade.
"É preciso repensar o negócio de cartões, pois a receita do rotativo é enorme, mas não significa que seja um bom produto", diz o presidente da Credicard. Uma das desvantagens seria a sazonalidade da linha, que tende a cair significativamente em períodos de mercado de trabalho aquecido. "O rotativo é muito rentável, mas oferece poucos meios de controle. O cliente entra e sai a hora que quer, se sente explorado e, por isso, não é fidelizado", diz.
À frente da Credicard desde o fim de 2008 e, anteriormente, no comando da Losango, Andrade conta que, sempre que se tentou baixar a taxa de juro do rotativo, o consumidor não reagiu. "Teoricamente, eu ganharia se conseguisse atrair clientes de outros bancos ou se os meus passassem a usar mais o rotativo", diz. "Mas como o consumidor não percebe, perco receita e não agrego novos consumidores", completa.
O crédito pessoal, em compensação, apresenta vantagens como a maior previsibilidade de pagamento do empréstimo, que se reflete em menores riscos de inadimplência. Além disso, os executivos do mercado ressaltam o alto nível de recorrência à linha por parte do tomador.
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