jornal Valor Econômico 29/11/2010 - Adriana Cotias
Um Brasil inteiro é pouco para a Redecard. Além de adotar uma agressiva estratégia no país para ganhar fatias de mercado após o fim da exclusividade da concorrente Cielo com a bandeira Visa, a credenciadora sinaliza ter ambições além-fronteiras. Em encontro com analistas e investidores da Apimec (associação que representa os profissionais de investimentos), o presidente da empresa, Roberto Medeiros, revelou que avalia opções de expansão no front internacional, o que seria um feito inédito para uma companhia local do setor de captura de transações com cartões de crédito e débito.
O México é um mercado que a empresa já estudou e oferece oportunidades maravilhosas no chamado ramo de adquirência, mas não há no país um esforço do governo para formalizar a economia e transformar os pagamentos manuais em eletrônicos. "O maior inimigo dessa indústria é a economia informal", disse Medeiros. "Por enquanto não encontramos nenhuma operação (internacional) que tenha o volume e a remuneração de capital que há no Brasil."
Localmente, onde o fenômeno da internacionalização faz a via inversa e empresas estrangeiras têm demonstrado interesse em participar desse mercado, o executivo comemora o credenciamento recorde no terceiro trimestre, com algo entre 40 mil e 45 mil novos lojistas adicionados a sua base ao mês, mesmo que sob uma estrutura de custos mais elevada. Para reduzir a dependência do credenciamento dos bancos, a Redecard investiu em força de vendas própria (parte dela terceirizada) em todo o país. Com isso tem aumentado o leque de serviços prestados aos estabelecimentos comerciais. A antecipação automática de recebíveis na própria maquininha de captura (o chamado POS) é um desses produtos que acabou ganhando ainda mais força.
Para o último trimestre do ano, o executivo prevê antecipar até mais do que os 20% que vem estabelecendo como referência, a exemplo do que se observou no período entre julho e setembro, quando a credenciadora adiantou aos lojistas 22,2%, ou R$ 6,8 bilhões, do total de transações de crédito. Medeiros conta que, já no começo do trimestre atual, numa única operação, adiantou R$ 425 milhões a um grande varejista.
A mudança de mix, com esforços para ganhar a fidelidade de grandes clientes, reduziu, porém, a remuneração obtida com o pré-pagamento. Do segundo para o terceiro trimestre, o resultado dessa linha de negócios, líquido de despesas financeiras, caiu 14,5%, a R$ 138 milhões. Nessa conta, também houve impacto do aumento de custo de "funding". Com uma captação de "commercial papers", feita neste ano a 106% do CDI, esse passou a ser o piso para financiar a empresa, diz Medeiros.
A ofensiva para ganhar território no mercado nacional também pressionou a taxa líquida de desconto e acabou pesando sobre o resultado operacional de caixa (o lajida) e o lucro líquido recorrente, que caíram 6% nos nove primeiros meses de 2010, na comparação com o mesmo intervalo do ano passado, a R$ 1,7 bilhão e R$ 1,1 bilhão, respectivamente. O custo por transação, por sua vez, subiu 12% nesse mesmo intervalo, a R$ 0,36.
Não no quarto trimestre, mas nos próximos, o custo unitário tende a baixar, espera Medeiros, até porque a Redecard ainda não se beneficiou dos ganhos de escala decorrentes da fidelização de grandes varejistas. O Magazine Luiza, por exemplo, fechou acordo com a credenciadora em setembro, mas só agora começou a operar preferencialmente com a rede, porque precisou fazer ajustes tecnológicos nos seus terminais de venda.
Na sua carteira, a empresa tem 18 mil varejistas classificados como grandes e médios e 1,5 milhão de pequenos, segmentação que proporciona a melhor remuneração. Como a Visa tem mais cartões no mercado, os esforços são para ocupar espaços e roubar clientes da Cielo. Só que, cinco meses após a abertura do mercado, os volumes capturados com a bandeira ainda não são vultosos e a Redecard não se beneficia dos descontos de escala.
A entrada de novos competidores internacionais no setor, depois da investida do Santander com a GetNet é, por ora, vista com algum ceticismo por Medeiros. Ele diz que as empresas que aspiram avançar no Brasil ainda não sabem e não têm estrutura tecnológica ("softwares" e "backoffice") para tratar as operações parceladas sem juros, uma invenção do mercado brasileiro, criada para concorrer com o tradicional cheque pré-datado. "Não acho que os novos entrantes tenham mais do que 10% do mercado num horizonte de três a cinco anos."
Se 2009 foi o ano da regulação e 2010 o da competição, Medeiros reconhece que 2011 pode ser o ano em que o mercado vai discutir se os controladores das credenciadoras vão ou não fechar o capital das empresas. Apesar das ações estarem abaixo do preço da oferta pública inicial (IPO), não há planos de se fazer a recompra dos papéis. "A companhia não sabe operar essas coisas. Não faço uma gestão por trimestre, mas de médio e longo prazo."
No centro nervoso, a identificação das falhas no Natal
Para subir pelas escadas de emergência do 12º andar para o 13º no Castelo Branco Office Park, em Barueri, na Grande São Paulo Oeste, um crachá de identificação eletrônica libera a passagem, tanto no piso inferior quanto na chegada ao destino. Numa área de quase 2 mil metros quadrados está uma sala de circulação restrita aos 60 funcionários que se revezam em turnos, 24 horas por dia, sete dias por semana. É nela que está o centro nervoso da Redecard, onde a empresa faz o monitoramento das transações com cartões de crédito e débito. Foi ali que se identificou, na véspera de Natal de 2009, as falhas na captura dos lojistas, que lhe foram tão caras.
Em tempo real, os telões exibem a performance das operações no Brasil inteiro. A cada minuto há atualização nos terminais dos técnicos, em grande parte com formação em engenharia e tecnologia da informação. Num emaranhado de estatísticas, esses profissionais conseguem medir, por exemplo, se o índice de aprovação das operações está de acordo com o histórico para aquela hora, dia e ano em cada POS ou terminal de venda, em cada estabelecimento comercial. Qualquer desvio, eles disparam alertas que são ferramentas úteis na prevenção de fraudes, conta o diretor de tecnologia da Redecard, Alessandro Raposo. Qualquer anomalia no tráfego das transações também é ali que se detecta.
Na tarde do fatídico 24 de dezembro de 2009 também foi assim. Imediatamente, todos os executivos da gerência técnica para cima da Redecard e da processadora Orbitall foram reportados por meio de mensagens instantâneas. Depois de quatro horas de lentidão na captura das transações, foi trocado um componente que liga com a rede de telecomunicações. Segundo Raposo, esses problemas não devem se repetir neste ano. "Temos capacidade instalada para capturar cinco vezes o volume esperado para o Natal."
Quanto às portas corta-fogos travadas, o executivo tranquiliza o visitante: quando dispara o alarme de incêndio, as saídas são liberadas automaticamente.
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