13 de abr. de 2011

'MOBILE' À BRASILEIRA NA NIGÉRIA

jornal Valor Econômico 13/04/2011 - Adriana Cotias

Um país com as dimensões do Estado do Mato Grosso e uma população de mais de 150 milhões de pessoas. A energia elétrica só está disponível algumas horas por dia e tudo funciona com gerador. A rede de telefonia fixa alcança 1,7 milhão de linhas, mas há 70 milhões de celulares. Só 45 milhões têm conta em banco e a base de cartões limita-se a 300 mil unidades Visa e MasterCard, todos pré-pagos. Tudo nessa economia se move a dinheiro e muitas notas são necessárias para se pagar uma simples conta de restaurante, já que um maço com mil nairas, a moeda local, equivale a pouco mais de US$ 6,00. É sob esse pano de fundo que emerge o "mobile payment" (pagamento via celular) na Nigéria. E com tecnologia brasileira.

A Freeddom, a mesma empresa que desenvolveu a plataforma tecnológica do Oi Paggo para a Oi, venceu concorrência do United Banking for Africa (UBA), maior banco nigeriano, com 8 milhões de contas, para colocar de pé o mobile payment e assim permitir que o dinheiro viaje na mesma velocidade de uma mensagem de texto.

Com o aumento da produção petrolífera e da circulação monetária nos últimos anos, a Nigéria tornou-se um dos principais mercados africanos. E como em outras nações do continente, a população de baixa renda enfrenta dificuldades de acesso bancário, pois mal consegue comprovar endereço.

Com o batizado U-MO (de "you mobile"), a ideia é substituir, por exemplo, as remessas de cidades como Lagos ou a capital Abuja para as tribos no interior. O envio hoje é feito informalmente pelos motoristas de ônibus, que carregam pacotes de dinheiro pelo itinerário, fazendo a entrega para as famílias locais. Para as instituições financeiras será uma forma de avançar na bancarização da população e no crédito ao consumo, que praticamente inexiste no país.

"O projeto nasce como um 'moedeiro', mas a intenção é que evolua para um 'business' de crédito em dois ou três anos. O que o banco central quer é sumir com o dinheiro de papel da sociedade", diz o presidente da Freeddom, Cicero Torteli. A partir do conhecimento dos hábitos de uso do dinheiro virtual, o banco pode construir um histórico de movimentação, como base para avaliar o risco de uma operação.

Desde janeiro, o sistema está rodando como piloto, com 5 mil funcionário do UBA e 100 agentes dedicados a fazer a recarga dos celulares com a moeda virtual, exercendo papel similar ao dos correspondentes bancários brasileiros. O Central Bank of Nigeria (CBN) recebeu, no fim de março, os números dessa fase de testes dos 16 consórcios participantes, mas na fase preliminar só quatro estavam efetivamente reportando a experiência.

O UBA já tinha sido o primeiro integrante de um consórcio reconhecido formalmente por ter um parceiro habilitado a construir a solução mobile. Agora só falta o aval do CBN para ampliar o alcance da tecnologia para além dos 5 mil participantes do piloto.

Nesse sistema, o celular passa a abrigar uma espécie de conta corrente e o consumidor pode usar o saldo para fazer transferências para outros aparelhos, pagar contas ou realizar compras no varejo. Para tanto, será preciso filiar lojistas, aos moldes das credenciadoras de cartões. No Brasil, foi exatamente esse o ciclo construído no Oi Paggo, que atuava como emissor, bandeira e adquirente, antes de a Oi se unir a Cielo na atual Paggo Soluções.

"Só o envio de dinheiro não rentabiliza o negócio do banco. Os valores são pequenos, feitos normalmente uma única vez por mês", diz o gerente de novos negócios da Freeddom, Guilherme Messiano. Quando um cliente U-MO fizer uma transferência, quem recebe pode sacar o valor em qualquer correspondente, pagando uma tarifa pelo serviço, ou pode se unir à rede. Se o destinatário aceitar tal convite virtual, quem mandou o dinheiro recebe um rebate, um prêmio na moeda virtual.

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